Não se pode negar que o cenário é bastante desafiador para todas as empresas do território nacional, mas, ainda assim, é possível identificar algumas oportunidades na área tributária
Diante dos desafios que a pandemia da Covid-19 vem impondo, tanto para as pessoas quanto para as empresas, no âmbito tributário, o Governo Federal, por meio da Receita Federal do Brasil, adotou diversas ações visando diminuir o impacto gerado pela situação atual. As atualizações e oportunidades tributárias frente aos desafios da pandemia foram abordados no 1º dia do Congresso Tributário ANEFAC, em 21 de julho. Os palestrantes desta temática foram os especialistas da KPMG, Roberto Puoço, sócio da área de R&D Tax Incentives e Tax Consulting, Marcus Vinicius, tax partner – head of Tax, Maria Isabel Ferreira, sócia líder da área de Tributos Indiretos e Aduaneiros, Valter Shimidu, sócio líder da área de Trabalhista e Previdenciário, e Daniel Maia, sócio diretor de consultoria em Comércio Exterior, e Julio Assis, sócio do Ferraz de Camargo e Matsunaga Advogados.
Dentre as ações adotadas, especificamente, frente aos desafios no âmbito tributário no Brasil, Puoço destaca:
– redução a “zero” da alíquota do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) para todas as operações de crédito, sendo irrelevante a sua finalidade, contratadas no período de 03 de abril a 03 de julho de 2020 (Decreto nº 10.305/2020);
– redução temporária das alíquotas de IPI (Imposto sobre os Produtos Industrializados) sobre produtos específicos visando subsidiar a implantação de medidas sanitárias de contenção da disseminação do vírus (Decreto nº 10.285/2020);
– alteração nos prazos de entrega de diversas declarações e obrigações acessórias como Declaração de Ajuste Anual do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física (DIRPF), Escrituração Contábil Digital (ECD) e Escrituração Contábil Fiscal (ECF);
– prorrogação do prazo de recolhimento das contribuições previdenciárias patronais devidas pelas empresas, inclusive aquelas substitutivas da folha de pagamento pelo empregador doméstico, além do PIS (Programa de Integração Social) e da COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), relativos aos fatos geradores de março e abril de 2020 (Portaria ME nº 139/20, alterada pela ME nº 150/20) e;
– simplificação do procedimento de despacho aduaneiro de importação no caso de mercadorias destinadas ao combate de doença provocada pelo Coronavírus (Instruções Normativas RFB nº 1.927 e 1.929/2020).
O especialista aponta, ainda, os principais tributos que tiveram o seu pagamento adiado por causa da pandemia:
– SIMPLES Nacional: prorrogação por seis meses do prazo de pagamento dos valores devidos referente aos meses de março, abril e maio de 2020;
– PIS/COFINS: prorrogação dos prazos de recolhimentos referentes aos fatos geradores dos meses de março e abril de 2020 para agosto e outubro de 2020, respectivamente e;
– Contribuições Previdenciárias Patronais devidas pelas empresas: prorrogação dos prazos de recolhimentos referentes aos fatos geradores dos meses de março e abril de 2020 para agosto e outubro de 2020, respectivamente.
Com a extensão desses prazos, as empresas procederão os recolhimentos, como feitos normalmente, nos novos prazos, não incidindo a cobrança de juros e multa moratória quando pagos nos novos prazos de vencimento.
Já com relação as obrigações acessórias, Puoço entende que, os focos das empresas deverão ser:
– DIRPF, referente ao ano-calendário de 2019, prorrogada para até 30 de junho de 2020;
– ECD, referente ao ano-calendário de 2019, prorrogada para até 31 de julho de 2020;
– Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF) e Escrituração Fiscal Digital da Contribuição para o PIS/PASEP, da Contribuição para o COFINS e da Previdência Social Contribuição de Segurança sobre a Receita (EFD – Contribuição) relativas aos meses de abril, maio e junho, prorrogadas para até 31 de julho de 2020;
– ECF, referente ao ano-calendário de 2019, e aos casos de extinção, cisão (parcial ou total), fusão ou incorporação ocorridas no período entre janeiro e abril de 2020 prorrogada até 30 de setembro de 2020 e;
– formulário sobre os gastos com pesquisa e desenvolvimento para as empresas beneficiárias do incentivo fiscal de inovação tecnológica – Lei nº 11.196/05 (FormP&D) – referente ao ano calendário de 2019 – prorrogado até 30 de novembro de 2020.
As empresas devem estar atentas com todas estas alterações e aos novos prazos. Apesar da prorrogação para a apresentação das obrigações, segundo Puoço, é muito importante que não se deixe para a última hora o preenchimento e a avaliação da qualidade das informações que serão prestadas. “Isso porque, em muitos casos, o distanciamento social pode gerar dificuldades para as pessoas, envolvidas no preenchimento das obrigações, obterem todas as informações e esclarecimentos necessários para o correto preenchimento das informações, já que, muitas vezes, essas informações estão dispersas entre outras pessoas e/ou áreas da empresa. Em razão disso, não deixar para a última hora continua sendo um dos melhores conselhos”, adverte.
Alterações de contrato de trabalho entre empregador e empregado
Outro ponto de atenção são os impactos relativos a Folha de Pagamento. Dentre as principais medidas adotadas pelo Governo Federal, no âmbito trabalhista e previdenciário, inicialmente publicada na Medida Provisória nº 927, em 22 de março de 2020, dentre outras medidas, flexibilizou algumas normas trabalhistas por meio da celebração de acordo individual entre empregador e empregado, permitindo a adoção de medidas como: adoção do “teletrabalho”, antecipação de férias individuais, concessão de férias coletivas, antecipação de feriados, prorrogação de banco de horas, suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde do trabalho e diferimento do recolhimento do Fundo Garantidor do Tempo de Serviço (FGTS). Vale lembrar que essa MP não foi convertida em Lei, tendo o seu prazo de vigência encerrado em 19 de julho de 2020.
Além dessa, publicada em 31 de março de 2020, a Medida Provisória nº 932 determinou, excepcionalmente, até 30 de junho de 2020, a redução das alíquotas das contribuições ao “Sistema S” (SESI, SENAI, SESC, SENAC, SEST, SENAT, SENAR e SESCOOP). Essa MP foi convertida na Lei nº 14.025 em 14 de julho de 2020.
Já a Medida Provisória nº 936, de 1º de abril de 2020, dispôs, dentre outras coisas, da implementação da possibilidade de suspensão de contrato de trabalho e redução de jornadas e salários como forma de conter efeitos econômicos da pandemia advindos do Coronavírus. Aqui, o foco principal, na visão de Puoço, foi a criação do “Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda”, a redução proporcional de jornada de trabalho e salários e a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho. “Essa MP foi convertida na Lei n° 14.020/20 e ampliou os prazos desse programa, permitindo também que as empresas possam suspender os contratos de trabalho ou reduzir salários e jornadas de seus empregados até o final do ano de 2020 ou enquanto durar o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo n° 6/20”, pontuou.
Oportunidades e cuidados na área tributária em 2020
Não se pode negar que o cenário é bastante desafiador para todas as empresas que estão no território nacional, mas, ainda assim, é possível identificar algumas oportunidades na área tributária, isso levando em conta o judiciário que impacta fortemente as empresas. Puoço lista algumas, que considera importantes neste momento:
– discussão da incidência do IPI na revenda de bens importados (“Tema 906 STF”);
– possibilidade de “aceleração” dos prazos de restituição/ressarcimento;
– discussão quanto a apropriação de créditos de IPI decorrentes de aquisições realizadas junto a empresas localizadas na Zona Franca de Manaus (“Tema 322 STF”) e;
– substituição de depósitos e garantias judiciais;
Por outro lado, algumas das principais iniciativas e oportunidades em discussão, atualmente, são, na avaliação de Puoço:
– discussão quanto ao momento de tributação dos créditos de PIS e COFINS decorrentes da exclusão do ICMS nas bases de cálculo das referidas contribuições;
– inconstitucionalização das Leis 10.637/02 e 10.833/03 – Conceito de Insumo – Creditamento – Superior Tribunal de Justiça (STJ);
– ICMS/ST no PIS e COFINS do “substituído” (“Tema 1098 STF”) e;
– STF e o Planejamento Tributário (Lei Complementar nº 104 e art. 116 CTN).
Além dos programas e medidas adotadas pelo Governo, no sentido de prorrogar o prazo de pagamento de alguns tributos e de entrega de algumas obrigações acessórias, bem como da criação de programas e formas de preservação dos empregos, as empresas também estão buscando diversas alternativas tributárias que possam gerar alternativas e formas de recuperação de caixa. De acordo com Puoço, essas alternativas, em sua maior parte, não dizem respeito a “novas” disposições da legislação, mas sim na revisão e adoção de oportunidades que já existem na legislação em vigor. Alguns temas em análise e discussão pelas empresas que ele acredita que podem ser citados são:
– avaliação quanto a alteração do regime de tributação das variações cambiais do regime de competência para o regime de caixa no exercício de 2020;
– revisão das taxas de depreciação e amortização em decorrência da redução de jornadas e queda dos níveis de produção;
– exclusões nas bases de cálculo do IRPJ e da CSLL das subvenções de investimento decorrentes de benefícios fiscais de ICMS e;
– utilização do benefício fiscal referente à Inovação Tecnológica (“Lei do Bem” – Lei nº 11.196/05).
“Além dessas alternativas, diversas empresas estão revendo e revisando valores de dispêndios, que foram incorridos ao longo dos últimos cinco anos quanto a possibilidade de apropriação de créditos de PIS e COFINS não-cumulativos, com base na aplicação do conceito de “insumos” a partir da aplicação dos conceitos de “essencialidade e relevância”, decorrentes das disposições apresentadas pelo STJ. Existem, também, oportunidades para área aduaneira, especificamente, quanto a possibilidade de recuperação da taxa SISCOMEX incidente nas importações, potencialização do benefício decorrente do Programa REINTEGRA, redução das alíquotas do imposto de importação em algumas situações específicas e aplicação de programas aduaneiros como o “Regime Aduaneiro Especial de Entreposto Industrial sob Controle Aduaneiro Informatizado” (RECOF) e o Programa de “Operador Econômico Autorizado” (OEA)”, explica o sócio da KPMG.
Para finalizar, Roberto Puoço, reforça que os principais cuidados e atenções que as empresas precisam ter, em relação as atualizações, é avaliar os principais pontos que impactam suas atividades. Pois, apesar de alguns itens não serem aplicados de forma mais ampla a todas as empresas, por outro lado, aqueles relacionados a prorrogação das obrigações acessórias e ao prazo de pagamento de alguns tributos são aplicáveis a uma parcela relevante de empresas.
O Congresso Tributário ainda abordou:
Tax Transformation: oportunidades e desafios https://www2.revistaanefac.org.br/edicao/203/congresso-tributario-2-203/
Os impactos imediatos da Reforma Tributária https://www2.revistaanefac.org.br/edicao/203/congresso-tributario-3-203/
Pontos de atenção no preenchimento da ECF 2020 https://www2.revistaanefac.org.br/edicao/203/congresso-tributario-4-203/
Confira o conteúdo completo do evento no EducaANEFAC, link abaixo.