Durante os últimos seis anos o Brasil tem passado por uma crise sem precedentes, sendo um de seus principais efeitos – e o mais perverso – o desemprego, que forçou as famílias a cada vez mais abordarem assuntos relacionados a educação financeira, como por exemplo, formas de “esticar o orçamento familiar”. Além disso, na opinião de Fábio Cardoso Machado, sócio da FBF Consultoria, outro fator que corrobora com a intensificação da discussão no Brasil e no mundo, tem sido o aumento do acesso ao crédito, forçando os governos a investir em educação financeira.
Dados da Standard and Poor´s mostram que os países que mais investem nessa área são a Noruega, Dinamarca e Suécia, com cerca de 71% da população educada sobre o tema, na sequência aparecem Israel e Canadá, com 68%. Contudo, se analisarmos a média mundial, apenas 35% dos homens e 30% das mulheres possuem bons conhecimentos sobre o assunto. No Brasil, em 2010, foi instituída, por meio do decreto federal número 7.397/10 a ENEF (Estratégia Nacional de Educação Financeira), que é uma política de Estado de caráter permanente, com o escopo de fornecer e apoiar ações que ajudem a população a tomar decisões financeiras mais conscientes. A iniciativa decorre da articulação do CONEF (Comitê Nacional de Educação Financeira). “Todavia, foi em 2017 que o tema ganhou mais força, com a inclusão da educação financeira na Base Nacional Comum Curricular da educação infantil e do ensino fundamental. Ao todo, existem mais de mil e trezentos projetos de educação financeira no país”, avalia Machado.
Todos estão sujeitos a problemas financeiros, executivos ou não. Para mitigar o risco, além de ter uma boa educação financeira e saber lidar com o dinheiro, é necessário saber utilizar os três “P´s”:
– Planejar: a aquisição de produtos e serviços de forma planejada pode evitar a tomada de crédito a juros altos;
– Priorizar: jamais adquirir algo sem antes avaliar se aquele produto ou serviço é realmente necessário ou não. Dessa forma, priorizar a aquisição apenas daquilo que é absolutamente necessário;
– Poupar: guardar resulta na possibilidade de aquisição do produto e ou serviço à vista, gerando melhores condições para a negociação de descontos.
“Tanto ou mais importante que faturar e ou ganhar um bom salário no final do mês, é gastar com sabedoria, com parcimônia. Não raro conhecemos executivos com bons salários, mas que gastam mais do que recebem. E o resultado: vivem pagando juros de utilização de cheque especial. Por outro lado, frequentemente vemos casos de profissionais com salários relativamente mais baixos, que por terem custo de vida menor, possuem mais capacidade para poupar”, aponta o sócio da FBF Consultoria.
Vale lembrar que educação financeira não é somente ser bom em matemática e sustentar vasto conhecimento de finanças em geral. Machado adverte: em geral são meras ferramentas e como tais, apenas irão gerar uma boa gestão financeira se utilizadas da forma correta, aplicando-as sempre que necessário. “A maneira como lidamos com o dinheiro é fundamental para sermos bem-sucedidos financeiramente e o mero conhecimento desse assunto não é garantia de sucesso financeiro. Todos conhecemos casos de pessoas com bom nível intelectual que por vezes passam o mês utilizando o limite de cheque especial, enquanto outras, que não cursaram nem o ensino médio, possuem mais bens a declarar quando da declaração de ajuste anual do imposto de renda”, explica..
Em nossa sociedade crescemos ouvindo que “dinheiro não traz felicidade”, “dinheiro suado é dinheiro abençoado”. Contudo, o especialista diz que na realidade tudo isso é fruto do pouco conhecimento sobre educação financeira de nossos antepassados. “Ao adquirir mais conhecimento sobre o assunto, aprendemos sobre a real importância do dinheiro e de seus benefícios. Conseguimos perceber que no final das contas, o importante é fazer o dinheiro trabalhar para você e não ao contrário”, salienta.
Uma vida financeira saudável traz inúmeros benefícios para o indivíduo e o principal deles é a tão desejada liberdade. Por liberdade, ele explica, entenda-se uma vida tranquila, com a realização de sonhos, qualidade de vida, poder proporcionar para os seus uma vida confortável, ter a possibilidade de investir em conhecimento e com isso melhorar ainda mais seu nível e buscar outros patamares de prosperidade e de realização pessoal.
Atenção a negociação com as dívidas
Dentro dos conceitos de educação financeira que podem ajudar em tempos de crise é a negociação, de acordo com o especialista, são:
- Capacidade de argumentar e saber ouvir: escutar bastante antes de falar poderá fornecer as ferramentas necessárias para conduzir uma boa negociação;
- Domínio do assunto: pesquisar sobre os custos de aquisição e a composição do produto ou serviço poderá ser decisivo para obter melhores condições de compra e/ou financiamento;
- Planejamento: identificar o melhor momento para a aquisição de um produto ou serviço certamente irá fazer toda a diferença para obtenção de uma melhor condição.
Já com relação os cuidados, Machado, aponta que na negociação é importante:
Timing: a pressa ou a demora excessiva no fechamento de uma negociação certamente irá gerar um resultado desfavorável para quem adquire um empréstimo, um carro, ou uma casa. Ao perceber que a contraparte está fora do timing, a negociação resultará em prejuízo para o contratante ou mesmo da não realização do negócio;
Opções: identificar mais de um caminho é fundamental para fechar uma boa negociação. Ficar na mão de um único fornecedor pode ser danoso. Ao não ter opções de bancos por exemplo, o tomador de crédito irá contratar com juros mais altos, pelo mesmo motivo que o investidor irá aplicar a juros mais baixos ou com altas taxas de administração, performance;
Emocional: quando tratar-se de aquisição de um bem ou serviço, tais como: um carro, uma casa, ou até mesmo um cartão de crédito ou um limite de cheque especial, deixar o emocional/impulso de lado e priorizar o racional. Um bom exemplo do embate emocional x racional ocorre quando realizamos o test drive de um carro que desejamos muito. Ao dirigir o carro dos sonhos – especialmente quando tem aquele cheiro de 0 km – o emocional costuma aflorar e entra em cena a sedução da entrada 0 e parcelas a perder de vista. Em situações como essa, optar por ir embora da concessionária, pensar racionalmente e somente após analisar muito bem os prós e contras, além de se sentir preparado para tomar a decisão pela compra ou não do bem.
Já quando o assunto são as empresas, Machado entende que elas são constituídas por pessoas, assim sendo, os mesmos cuidados e estratégias utilizadas por pessoas físicas aplicam-se às pessoas jurídicas, sendo que neste caso, a empresa deverá investir tanto quanto possível em cursos sobre negociação para que seus colaboradores estejam aptos a defender os melhores interesses da empresa que representam, sempre focando no ganha-ganha-ganha.
“Importante cultivar nos representantes da empresa o conceito de independência junto a seus parceiros, sejam instituições financeiras, clientes ou fornecedores. Nada mais nocivo para qualquer empresa do que possuir grande concentração de negócios, seja de faturamento junto a clientes, seja de operações junto a uma única instituição financeira ou de compras junto a um único fornecedor”, ressalta o especialista.
A educação financeira é uma das ferramentas mais poderosas de distribuição de renda e prosperidade, pois com ela, as pessoas podem alcançar seus objetivos de qualidade de vida e as corporações podem mirar em um maior faturamento, o que será convertido em lucro aos acionistas e ou sócios, além da possibilidade de reinvestimento na própria corporação. “O Brasil é um país sem poupança e por isso estamos patinando há décadas sem sair do lugar, passando por crises sucessivas, destruindo o futuro de várias gerações. Apenas com planejamento para investir melhor em educação, incluindo aí a financeira, é que teremos cidadãos financeiramente conscientes, que serão a base para um país desenvolvido, com maior capacidade de poupança e com boas perspectivas de futuro”, finaliza.