Basicamente, se uma empresa reduz suas emissões, ela recebe subsídios de carbono, que podem ser mantidos para cobrir suas necessidades futuras ou então vendidos para outra empresa
É notório no mundo o nível de comprometimento de alguns países em metas contra as mudanças climáticas, mas estimativas da IEA (International Energy Agency) apontam que 2021 registrará o segundo maior aumento de emissões de gases do efeito estufa da história. A questão ambiental vem sendo discutida em reuniões em todo o mundo. O Brasil, por exemplo, por sua característica, vem sendo cobrado a desenvolver uma legislação específica de como viabilizar o mercado de crédito de carbono.
Iniciada desde a revolução industrial, o processo para as mudanças climáticas vem crescendo ano após ano. “Elas são as emissões de gás de efeito estufa na atmosfera terrestre, que provocam uma série de contradições. Ao mesmo tempo que tem uma revolução industrial em curso desde 1919 até hoje, tem um efeito perverso que é a quantidade de emissões que ela persegue. Ou seja, as consequências”, explica Marco Antonio Fujihara, diretor de novos negócios da TechSocial, que palestrou no Congresso ANEFAC Digital 2021.
Existem muitas definições de mudanças climáticas, mas o especialista utiliza a do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que trabalha na medição do efeito do gás estufa na atmosfera terrestre, que nada mais é do que o resultado do fator humano, muito conhecido como Global Warming, ou no português, aquecimento global. As principais causas estão relacionadas, para a maioria dos cientistas, com as práticas humanas realizadas de maneira não sustentável. “Isso muda uma série de parâmetros no mundo inteiro, pois existem causas e efeitos das mudanças climáticas. As causas mais comprovadas são necessariamente as questões das emissões de gases que provocam efeitos colaterais como o aumento da temperatura, a extrema variação climática e o aquecimento dos oceanos, entre outros. Temos, por exemplo, maior incidência de furacões”, explica.
O aquecimento global não é apenas uma questão científica, ele provoca, segundo Fujihara, grandes modificações na economia. Para ele, se pensarmos que a nossa matriz energética ainda é feita em térmicas a carvão mineral, que libera certamente uma grande quantidade de gases na atmosfera levando às mudanças climáticas. “É um problema que afeta, por exemplo, a agricultura, que necessita das estações bem definidas para se desenvolver. A questão climática é econômica, técnica e científica. Mudar toda a matriz energética do planeta de um dia para o outro é complicado, por isso, é necessário um esforço muito grande para pensar em como as mudanças climáticas afetariam as empresas de um modo geral. Muitos cientistas têm feito estudos de quanto custaria uma descarbonização da atmosfera. Imagina o que incidiria nas empresas”, aponta.
Diante deste cenário, se faz necessário às organizações estabelecerem formas para mitigar ou se adaptar as mudanças climáticas. Segundo ele, o que se entende é que, o custo para isso irá cair sobre as empresas, pois quem emite o dióxido de carbono são elas. Muitos governos já têm criado imposto, na Escandinava, por exemplo, pode chegar até 120 dólares por tonelada. Uma empresa que possui sua matriz energética baseada em combustíveis fósseis, carvão mineral ou algo do tipo, precisa pagar esse imposto sobre as suas emissões, o que impacta de forma relevante aos acionistas e até mesmo no dia a dia dessa organização.
“Imaginamos que as políticas precisam ser dirigidas a diminuir os impactos e a causar o menor dano possível a atmosfera. É essa a grande discussão atual. Em como transformamos riscos em oportunidades. As primeiras soluções são o incentivo a utilização cada vez mais de energias renováveis, diminuir o consumo por determinados fósseis, trabalhar em mobilidade elétrica, reflorestamento, redução dos impactos do consumo, entre outros. Para fazer tudo isso, é preciso novas tecnologias nestas esferas, que vão impactar significativamente o futuro dos próximos 50 anos do planeta. A cobrança dessa mudança de postura sobre as questões climáticas é em primeiro momento dos acionistas e da sociedade, mas principalmente esse primeiro grupo, que está preocupado com a perenidade das organizações”, estima Fujihara.
Existem uma série de regulações sendo desenvolvidas no mundo inteiro, inclusive aqui no Brasil, sobre as emissões, inclusive sobre quem será responsável por pagar a conta. Devemos sempre olhar pela esfera das oportunidades, vislumbra o especialista, pela forma de transacionar essas emissões, ou seja, transformar essa redução em um ativo, por exemplo. Hoje, conseguimos precificar essas emissões e colocar no balanço e regular. As oportunidades estão nas empresas investirem em produtos com baixo impacto e teor de carbono. Os fundos preferem alocar capital em empresas mais sustentáveis.
Como funcionam os créditos de carbono?
Existe um primeiro mercado regulado de carbono que é aquele feito pelas relações ou acordos diplomáticos que já existem, começou no Protocolo de Quioto, em 1998, e foi até cinco anos trás com os Acordos de Paris. Está muito relacionado em uma transação entre os países que precisam reduzir sua emissão de gases do efeito estufa. No Protocolo de Quioto, o mercado regulado dividiu os países em dois tipos, aqueles que precisavam reduzir as suas emissões e aqueles que não. Como o acordo de Paris mudou tudo, não tem mais essa divisão, todos precisam reduzir as suas emissões. Daí nasceu um comprometimento global. Tudo isso está relacionado com o mercado regulado, que carece de algumas regulamentações, mas que devem acontecer esse ano com a próxima Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP-26), edição da principal cúpula da ONU para debate sobre questões climáticas, que será realizada em Glasgow, na Escócia, entre os dias 1º e 12 de novembro de 2021.
O segundo é o jurisdicional, que é quando uma jurisdição impõe, como acontece na Califórnia e em vários outros estados, uma regulação específica sobre as emissões. O terceiro é o mercado voluntário, onde as empresas podem operar as suas emissões por meio de compromissos próprios. “Na prática, uma unidade de medida do crédito de carbono equivale a uma tonelada de carbono lançado na atmosfera. Basicamente, se uma empresa reduz suas emissões, ela recebe subsídios de carbono, que podem ser mantidos para cobrir suas necessidades futuras ou então podem ser vendidos para outra empresa que está sem subsídios. Exemplo: quando ela faz um reflorestamento e outra não. Ou, ainda, quando uma fábrica no Brasil consegue reduzir as suas emissões a um custo de 10 dólares a tonelada, enquanto na França uma fábrica semelhante, a 50 dólares a tonelada. Então, é mais fácil ela comprar essas reduções, é uma questão de custo de oportunidade”, exemplifica Fujihara.
Várias empresas no mundo inteiro assinaram compromissos para a redução das suas emissões. De acordo com ele, uma empresa que emite 100 toneladas de carbono por mês ou por ano na fábrica, já a outra 50, então pode haver esse processo de compra e venda e aí todo mundo fica zero a zero porque a conta é global. “O que se compra na verdade é um título, que é auditado e verificado, não é simplesmente algo sem nenhum registro. Em linguagem financeira seria um derivativo. Essa redução se transforma num ativo que vai ser incluído no balanço e transacionado. O crédito de carbono é um ativo ambiental, que entra dentro dos fatores ESG. Um exemplo que temos mais recente é o caso da Microsoft, que precisa reduzir as suas emissões, comprou de uma organização brasileira que atua da Amazônia, a Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia). No Brasil ainda não é uma prática comum, mas de qualquer forma o mundo inteiro ainda está caminhando nesse sentido, que deve acontecer mais velozmente com medidas que serão tomadas esse ano na COP-26”, salienta.
As grandes oportunidades às empresas brasileiras derivadas do mercado de carbono estão justamente relacionadas a redução das emissões. Em transacionar esses ativos com empresas que não conseguem fazer o mesmo, seja por logística ou custo. Quando se vende um crédito, gera um ativo que vai para o balanço, além do valor de marca. “A transação vai se dar no mercado de balcão. Cada mercado voluntário tem uma série de standards que a empresa precisa cumprir, como um projeto, auditoria etc., mas se consegue adequar a engenharia de processos para a redução, consegue transacionar. A transformação digital pode ajudar muito nesse processo, com a tecnologia se cria algoritmos ou processos matemáticos para medir quanto é o preço interno de um carbono para a companhia. Primeiro existe o custo interno, que é igual a X, depois o preço que o mercado pode pagar X+1, gerando assim benefício financeiro, de marca e ainda, passa a contribuir com um mundo melhor”, alerta Fujihara
Com relação ao futuro, para ele, se dará a partir dos acordos entre os países para a redução das emissões, mas quem vai fazer isso são as empresas. As empresas que conseguirem se acoplar a isso sairão na frente.