Na pauta, em entrevista exclusiva, Ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, fala sobre privatização da Eletrobras, Lei do Gás, modernização do setor de energia elétrica e outros temas importantes para a economia
Em busca de margens lucrativas, setor elétrico é um dos favoritos de investidores e gestores de fundos. Apesar da queda no consumo de energia elétrica ao longo do ano passado, o setor ainda segue com boas perspectivas para 2021. Com uma agenda bastante ambiciosa, Ministério de Minas e Energia, deve focar na privatização da Eletrobras, seguir com Lei do Gás e modernizar o setor de energia elétrica. É claro, que muito ainda depende do Congresso Nacional, mas a pauta do setor elétrico não está relacionada com grupos adversos e sim com o setor privado, o que torna a agenda mais factível.
O Ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, conversou com a Revista ANEFAC sobre a agenda do setor, que trará grandes impactos à economia brasileira. Segundo ele, o Brasil é um país muito rico em recursos energéticos, com ampla diversidade de fontes e isso o torna atrativo aos olhos de investidores. Confira a seguir a entrevista.
Revista ANEFAC: Quais as principais medidas a serem aprovadas pelo governo para 2021, como por exemplo, a MP 998?
Bento Albuquerque: Ficamos muito felizes pela aprovação da MP 998 pelo Congresso Nacional na primeira semana de trabalho do ano legislativo, o que denota um grande alinhamento entre o Governo e o Congresso Nacional, mas, em especial, que o Congresso está informado e ciente das prioridades setoriais. Não podemos deixar de observar que essa foi a primeira Medida Provisória do setor aprovada pelo parlamento desde 2016, um grande feito.
Na mesma linha, temos um grande trabalho pela frente neste ano junto ao Congresso Nacional, no sentido de juntarmos forças para endereçarmos temas e medidas cujas aprovações são consideradas prioritárias para os setores de energia e de mineração, entre os quais destaco:
No Setor Elétrico:
– PLS 232/2016 e PL 1917/2015, cujas diretrizes são extremamente relevantes para a pauta de “Modernização do Setor Elétrico” conduzida pelo MME, com ampliação do mercado livre, redução de ineficiências e aprimoramentos no processo de contratação de energia, com separação de lastro e energia e, também, na formação de preços.
– Capitalização da Eletrobras: já estamos dialogando com o Congresso Nacional sobre a relevância da capitalização da Eletrobras, pela necessidade de recuperarmos a capacidade de investimentos da empresa, bem como a alocação adequada de riscos do setor elétrico, como o risco hidrológico. Na visão do Ministério, capitalizar a Eletrobras é a forma de transformá-la numa grande corporação, conforme ocorre em quase 70% das 54 maiores empresas de energia do mundo, como a ENGIE, EDP, ENEL e IBERDROLA.
No Setor de Petróleo e Gás:
– No Setor de Gás Natural, espera-se, para o início de 2021, que o Poder Legislativo aprove a Nova Lei do Gás. O PL 4.476/2020 (originalmente PL 6.407/2013) retornou em dezembro de 2020 à Câmara dos Deputados para apreciação das emendas aprovadas no Senado Federal. O novo marco traz diversos aperfeiçoamentos que visam assegurar a competição, bem como promover investimentos e o desenvolvimento do setor.
– O PL 3178/2019 modifica a Lei nº 12.351/2010, que dispõe sobre a exploração e a produção de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos, sob o regime de partilha de produção, em áreas do Pré-Sal e em áreas estratégicas. O objetivo é permitir a licitação com concessão nos blocos em que esse regime for mais vantajoso para o Brasil e instituir a disputa em igualdade de condições nas licitações de partilha da produção. O projeto busca viabilizar a contratação de áreas no regime de concessão dentro da área do polígono do Pré-Sal, nas bacias de Campos e Santos, e eliminar o mecanismo que garante preferência à Petrobras nos contratos firmados sob o regime de partilha de produção. Entende-se que tais medidas, que são de alto impacto para as políticas no âmbito do MME, contribuirão para a descoberta de jazidas de menores porte nas bacias de Campos e Santos, ou ainda, viabilizar a contratação de áreas unitizáveis de baixa materialidade nessa região.
No Setor de Mineração:
– A Lei de Faixa de Fronteira prevê a revisão da Lei nº 6.634/1979. A nova lei a ser enviada ao Congresso visa aumentar a atratividade aos investimentos em mineração, retirando restrições à participação do capital estrangeiro em áreas com potenciais minerais para ouro cobre, níquel, manganês, ferro estanho, dentre outros, alavancando a atividade.
– PL 1396/2019 altera a Lei nº 6.938/1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação. O PL permitirá que, em caso de desastres ambientais decorrentes de atividades econômicas, a exemplo da mineração, os entes federados, envolvidos e atuantes para trazer a normalidade ou mitigar os danos causados pela atividade que causou o desastre, sejam ressarcidos.
– PL 191/2020 regulamenta o § 1º do art. 176 e o § 3º do artigo 231 da Constituição Federal. O objetivo é estabelecer condições específicas para a realização de pesquisa e de lavra de recursos minerais e hidrocarbonetos e para aproveitamento de recursos hídricos para geração de energia elétrica em terras indígenas e institui a indenização pela restrição do usufruto de terras indígenas. A não regulamentação da matéria, além de insegurança jurídica, traz consequências danosas para o País, como: não geração de conhecimento geológico, emprego e renda; lavra ilegal; não pagamento de compensações financeiras e tributos; ausência de fiscalização; riscos à saúde, aos costumes e tradições dos povos indígenas e conflitos entre empreendedores e indígenas.
RA: Mesmo com a crise econômica, haverá investimentos no setor em 2021?
BA: Em tempos de severas restrições fiscais para a União, tenho o privilégio de estar à frente de uma pasta responsável por setores em que os investimentos são privados. Neste sentido, nosso dever e responsabilidade é o de criar as melhores condições possíveis para que esses investimentos ocorram, para que os setores de energia e de mineração atraiam recursos privados no Brasil e no mundo. Até porque, enquanto país em desenvolvimento, diferentemente de uma economia madura, temos expectativas de elevadas taxas de expansão desses setores, que são essenciais para o crescimento da economia.
Então, nosso papel é o de facilitar e induzir o investimento privado para garantir expansão, por meio de políticas públicas que criem incentivos adequados, mas também por meio de ações que preservem a segurança jurídica e a estabilidade regulatória dos setores. Minha percepção é de que estamos avançando na direção correta.
RA: Quais os principais investimentos do ministério em projetos de modernização e tecnologia para o setor de energia brasileiro?
BA: Com base na resposta acima, posso, assim, mencionar algumas políticas que levam à modernização do setor de energia brasileiro. O próprio nome já diz tudo: a Modernização do Setor Elétrico é a política que busca atualizar as regras setoriais para a nova realidade tecnológica e comportamental do setor elétrico e da economia mundial, decorrente de fenômenos como a transformação digital, a transição energética global e o empoderamento do consumidor.
A Modernização, depende, em alguns aspectos, de mudanças legais, o que vem sendo tratado pelo Congresso Nacional há anos, sendo que destacamos o envio do PLS 232 do Senado à Câmara dos Deputados recentemente, mais um passo do Congresso Nacional em nossa pauta conjunta. Mas é importante destacar que essa política está em franca implementação desde novembro de 2019, pois nos organizamos para antecipar todos os movimentos passíveis de serem feitos de forma infra legal, com bastante interação com os agentes e a sociedade, já que a Modernização é um processo e não um “virar de chave” com a aprovação dos projetos de lei em discussão no Congresso Nacional.
Outra política modernizante é o Novo Mercado do Gás. A Lei do Gás é de 2009 e todos sabemos que ela não foi capaz de induzir o crescimento de um mercado competitivo. Mas, de lá para cá, descobrimos o potencial de gás natural brasileiro no Pré-Sal. Da mesma forma que identificamos o quanto a atuação monopolista da Petrobras nesse mercado, sem capacidade econômico-financeira ou incentivos para expandir o mercado, nos impediu de deslanchar no uso mais amplo do gás pelos brasileiros – algo que tem potencial de beneficiar os consumidores e de ampliar a competitividade da nossa indústria no mundo. O Novo Mercado do Gás tem aspectos legais em tramitação no Congresso, mas também medidas que já vêm sendo adotadas infralegalmente, desde a alteração das regras para participação de termelétricas nos leilões de energia, passando por um trabalho de harmonização regulatória com os estados, a um olhar sobre concentração no mercado, com a participação do CADE e reflexo na política de desinvestimento.
E, quando olhamos para modernização e tecnologia no setor elétrico, não podemos deixar de mencionar o RenovaBio. Essa política tem reputação internacional e, além de viabilizar o desenvolvimento tecnológico dos nossos biocombustíveis, também tem um olhar sobre todos os tipos de bicombustíveis, reduzindo a emissão de gases causadores de efeito estufa, de maneira certificada.
Por fim, quando pensamos em desenvolvimento tecnológico mais literalmente, preciso destacar que, em fevereiro deste ano, pela primeira vez o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) se pronunciou sobre priorização de aplicação dos recursos de pesquisa e desenvolvimento publicamente orientados (e regulados pela ANEEL e ANP) a temas energéticos e tecnologias bastante alinhados à transição energética brasileira. Além disso, estamos desenhando com o Ministério das Ciências, Tecnologia e Inovação uma estrutura de governança conjunta, que contará com a participação da sociedade, para tratar de tecnologia e inovação nos setores de energia e de mineração, permitindo, cada vez mais, alcançarmos resultados positivos da pesquisa e do desenvolvimento tecnológico nesses setores.
RA: Quais os principais projetos do ministério para 2021?
BA: O Ministério de Minas e Energia dedica-se a proporcionar a atração de investimentos no setor energético brasileiro, visando à garantia do suprimento energético aos consumidores brasileiros e à, igualmente importante, geração de emprego e renda.
Neste sentido, podemos destacar os seguintes pontos:
- a) os programas “Luz para Todos” e o recente “Mais Luz para a Amazônia”, que se propõe a oferecer energia limpa e renovável a 82 mil famílias que vivem em áreas remotas da Amazônia Legal; a conclusão de obras de geração e transmissão de energia elétrica, que acrescentará centenas de megawatts (MW) de capacidade instalada distribuídos em usinas e linhas que representam cada vez maior cobertura de energia elétrica;
- b) no setor de petróleo e gás, destaca-se o Novo Mercado do Gás; o RenovaBio, que é a Política Nacional de Biocombustíveis, instituída por lei, cujo objetivo é expandir a produção de biocombustíveis no Brasil; o Programa Abastece Brasil é destaque no novo cenário downstream com a venda das refinarias pela Petrobras; o Bid SIM, voltado ao aperfeiçoamento de leilões; e o REATE, que visa à revitalização de campos de petróleo onshore; e
- c) no setor de mineração, não posso deixar de citar o Requerimento Eletrônico de Pesquisa Mineral, um sistema lançado pela Agência Nacional de Mineração (ANM) e que acelera e automatiza a autorização de pesquisa mineral (de 728 para até 34 dias); o Plano Lavra, que aprofunda a desburocratização e faz modificações normativas como objetivo de simplificar os trâmites entre a ANM e o minerador; e, ainda, de forma bastante abrangente, o programa “Mineração e Desenvolvimento”, que traz mais de 100 metas concretas para atrair investimentos e impulsionar a atividade mineradora no país.
RA: E a questão tecnológica?
BA: O Brasil é um país muito rico em recursos energéticos, com ampla diversidade de fontes. Também somos detentores de tecnologia de ponta no setor. Dessa forma, o mundo pode esperar que o país continuará empenhado em maximizar o retorno de toda essa abundância para a sociedade. Ademais, os investidores podem acreditar na manutenção dos pilares centrais da atual gestão, dentre os quais: boas práticas de governança; diálogo; transparência; previsibilidade; e segurança jurídica e regulatória.
Evoluímos de um setor que realizava apenas estudos de planejamento da expansão para um setor que planeja a implementação de políticas públicas, como a Modernização do Setor Elétrico e o Novo Mercado do Gás. Com os resultados dessas políticas, passamos a constituir um ciclo perfeito de coerência entre planejamento, política e regulação. Nesse sentido, possibilitamos o alinhamento entre a expectativa dos investidores e o interesse público.
Em face a todo o exposto, o que se espera é mais energia para crescer, consolidando a retomada da economia do país em 2021.
RA: Quais temáticas devem nortear o setor de energia em 2021?
BA: Os principais desafios para o ano de 2021 estão em linha com as medidas estruturantes para retomada da economia, observando as diretrizes do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), do Planejamento Decenal (PDE) e de programas desenvolvidos no curso de 2020.
Entre outras medidas, no setor elétrico, podemos destacar, para 2021: (i) avanços na Modernização do Setor Elétrico, considerando, inclusive, como parte deste processo, a aprovação da MP 998/2020; (ii) a capitalização da Eletrobras; (iii) a retomada de Angra 3; (iv) a expansão da nossa capacidade por meio da realização de leilões para sistemas isolados em estados da Amazônia Legal, decorrente de aumento de demanda prevista; (v) a realização de leilões de energia existente (A-4 e A-5), com possibilidade de retrofit e participação de carvão mineral nacional e gás natural; (vi) a realização de leilões (A-3 e A-4), com possibilidade de participação de fontes hidrelétricas, eólicas e solares fotovoltaicas e, por fim, no segmento de geração, (vii) a realização de leilões de energia nova (A-5 e A-6), com retirada de restrições de flexibilidade paras as termelétricas a gás natural e leilões de energia existente (A-1 e A-2).
No segmento da transmissão, estão previstos leilões no 1º e 2º semestres para integração ao Sistema Interligado Nacional (SIN), conferindo maior robustez ao sistema.
No setor de Petróleo, Gás e Biocombustíveis, destaca-se para 2021, entre outras, (i) a consolidação do Programa Renovabio, realçando os aspectos de eficiência, sustentabilidade e lógica de mercado; (ii) a simplificação de procedimentos no âmbito do programa Revitalização da Atividade de Exploração e Produção de Petróleo e Gás Natural (Reate); (iii) a implementação do novo marco legal do mercado de gás; (iv) o acompanhamento da consolidação da agenda de desinvestimentos da Petrobras nos setores de gás natural e refino; e, por fim, (v) a realização das licitações no regime de concessão da 17ª rodada, bem como dos volumes excedentes aos contratos de cessão onerosa (Sépia e Atapu), além da oferta permanente.
No que diz respeito ao setor de mineração, destaca-se, para 2021, entre outras: (i) a implementação do Programa Mineração e Desenvolvimento (PMD); (ii) o fortalecimento da ANM; (iii) a realização de esforços para a superação das restrições impostas às áreas com potencial mineral reconhecido; (iv) o aperfeiçoamento dos mecanismos de financiabilidade; e, por fim, (v) a licitação de direitos minerários do Serviços Geológico Brasileiro (CPRM), em especial, para cobre e fertilizante, bem como a licitação, em áreas em disponibilidade, da ANM.
Portanto, o desafio, entendido como oportunidade, nos impõe responsabilidades diante de um Brasil que já retoma ao consumo em “V” e que precisa ser acompanhado pelas fontes supridoras de energia e de atendimento à cadeia de bens, pela atividade mineral.
Com diretrizes claras, planejamento, regulação, fiscalização, transparência, previsibilidade, diálogo, respeito aos contratos e o compromisso das instituições, estamos certos de que 2021 será marcado pela consolidação das políticas estruturantes dos setores de minas e energia, bem como pela materialização da retomada dos investimentos, geração de emprego e renda, pari passu com o crescimento do país.
Por fim, destaco ainda o papel que o Brasil desempenhará no Diálogo de Alto Nível sobre Energia, das Nações Unidas, enquanto um dos líderes do tema “Transição Energética”. Já iniciamos o processo de preparação da nossa participação nesse relevante fórum internacional, em que teremos a oportunidade de destacar tudo o que estamos fazendo para que o Brasil continue na vanguarda da transição energética mundial.