“Para todo problema complexo existe sempre uma solução simples, elegante, plausível e completamente errada”
H. L. Mencken
O tema de redução de custos sempre vem à tona em épocas de crise nas empresas, consequência, entre outros fatores, de margens cada vez mais apertadas e clientes mais exigentes. Como uma parte significativa dos custos está relacionada a mão-de-obra, historicamente, o jeito mais fácil de reduzí-los sempre foi demitir pessoas, muitas vezes iniciando por aquelas com maiores salários. Mas será que esta é realmente a melhor maneira de reduzir custos?
Estudos feitos por distintos organismos em nível global mostram que reduzir custos cortando pessoas pode não ser a melhor saída. De acordo com o Instituto US Conference Board, das empresas que tentaram reduzir custos, 30% tiveram, na verdade, aumento de custos. Outro estudo feito pela Deloitte mostrou que 75% das companhias que demitiram funcionários com o objetivo de reduzir custos acabaram recontratando outras para as mesmas posições em até um ano. E finalmente, uma pesquisa conduzida pela consultoria estratégica McKinsey demonstrou que só 10% dos projetos de redução de custos tiveram sucesso três anos após a sua implementação.
O que vivenciamos em projetos feitos em mais de 50 países, nos últimos 25 anos, é que há um descontrole enorme quando se trata de gestão de custos e rentabilidade. Rateios imprecisos, empresas considerando que os dados apresentados pelo ERP (seja qual for ele) estão sempre corretos e, ainda pior, decisões de negócios como precificação e concessão de descontos sendo tomadas de forma completamente equivocadas. O fato é que as empresas medem muito mal os custos e a rentabilidade de seus produtos ou serviços e, consequentemente, as informações apresentadas não condizem com a realidade: em muitos projetos descobrimos que o produto ou serviço considerado o famoso “carro-chefe” era deficitário, enquanto outros tidos como “patinhos-feios” e deficitários revelaram-se os mais rentáveis.
Este não é um problema novo, na verdade os acadêmicos já vem estudando este fenômeno há mais de 30 anos. O artigo “Overhead can kill you” (em tradução livre, o Overhead pode matá-lo – Prof. Dr. Srikumar S. Rao, Columbia University, Forbes, 10 de Fevereiro de 1997), por exemplo, mostrou como a falta de controle sobre os altos e crescentes custos indiretos podia literalmente acabar com as organizações. No artigo citava um exemplo de uma indústria americana gigante que encontrou uma oportunidade enorme na falência de sua principal rival, mas que incrivelmente descobriu que seu produto “estrela” na realidade era deficitário e outros que imaginava que eram deficitários na verdade eram os seus produtos mais rentáveis. E isto acontecia por uma má alocação dos custos indiretos.
O fato é que, historicamente, com o aumento da complexidade dos negócios – que inclui diversidade de produtos, serviços, clientes, canais, fornecedores e processos – há um incremento significativo destes indiretos, que são de difícil apropriação ou atribuição a Produtos e Serviços. Saber como alocar os custos de uma máquina, por exemplo, a um Produto é simples, basta ver o quanto desta máquina foi dedicado a esta produção e pronto. Agora, como apropriar, por exemplo, os custos do Financeiro? E do Jurídico? Se perguntarmos para alguém de Sistemas, como deveria ser a alocação dos custos de dar suporte técnico internamente para Produtos – ou a alguém de RH como deveria ser a alocação dos custos a Produtos de contratar funcionários -, certamente ficaríamos dias sem conseguirmos estabelecer uma solução adequada. Isto ocorre porque não há uma relação direta de causa e efeito entre os custos destas atividades de RH ou de Sistemas com os Produtos ou Serviços produzidos. E por não haver uma relação direta, as organizações ou não alocam estes custos (e fazem um custeio por margem de contribuição), ou alocam pelas mesmas proporções dos diretos (Matéria-Prima a Mão-de-obra direta por exemplo) ou alocam por volume ou por faturamento, uma mescla destes últimos ou, pior ainda, assim o fazem na base do “feeling”. Como resultado, distorções severas são verificadas e aquela empresa que contratou um ERP novinho em folha, estrangeiro ou nacional e pensava que os custos estavam corretamente alocados, acaba se surpreendendo.
De fato, quando falamos de custos no ERP este é um assunto que tem muito mais a ver com questões contábeis, tributárias, estatutárias ou fiscais do que propriamente com Gestão. Podemos ter aí no ERP a famosa “ficha técnica” com todos os consumos de matéria-prima e mão-de-obra direta calculados corretamente, estoques e outros. Mas como apropriar de forma correta as despesas administrativas? Pior, como identificar o resultado Cliente a Cliente ou Canal a Canal?
Esta é outra fonte potencial de distorções: normalmente as organizações entendem que um cliente bom é aquele que nos trouxe um faturamento alto. Agora será que este cliente que faturamos muito foi realmente rentável ou exigiu tanto esforço da organização como um todo para atendê-lo (incluindo esforços administrativos, de vendas e de marketing) que passou a ser deficitário (ainda que tendo um “ótimo” faturamento)? De acordo com estudo publicado na Harvard Business Review, do total de clientes de uma organização, em média 20% deles são responsáveis por 150% a 300% do lucro da empresa; mais ou menos uns 70% praticamente empatam (ou seja, não dão lucro e nem prejuízo, mas sem dúvida ajudam a “pagar” o custo fixo) e uns 10% trazem prejuízos. A grande pergunta é “quais são eles?” e “o que fazer com esta informação?”. Porque se nada for feito e clientes extremamente rentáveis deixarem de ser clientes ou clientes muito deficitários seguirem sendo atendidos, isto pode representar um problema seríssimo e que pode colocar a organização sob risco severo.
A verdade é que, em tempos de crise e de mercados cada vez mais competitivos, é impossível gerenciar o que não se consegue medir. Faz-se necessária, portanto, a criação de mecanismos que possibilitem tomadas de decisão através de uma modelagem adequada de custos e rentabilidade. Uma vez que a mensuração seja feita de forma correta, decisões sobre redução de custos, rentabilidade e competitividade passam a ser tomadas de forma extremamente simples. É o que chamamos de “gestão à prova de crise”, consonante com as palavras do autor americano Michael Hammer: “O segredo do sucesso não é prever o futuro, mas sim criar uma organização que possa prosperar em um futuro que não pode ser previsto.”
*Artigo escrito por André Sanseverino que é sócio e diretor da MyABCM