Em números de empréstimos foram aproximadamente 3 mil operações e R$ 8 milhões de reais
O livro “O Banqueiro dos Pobres”, do criador do Grammen, primeiro banco de microcrédito do mundo foi uma inspiração para Alessandra Gonçalves de França, empreendedora e fundadora do Banco Pérola, quando tinha apenas 16 anos. Vinda de uma família de empreendedores do interior do Paraná, que se mudou para São Paulo em busca de melhores oportunidades de trabalho, acompanhou as dificuldades dos pais em conseguir crédito e resolveu fazer disso um propósito de vida. Ela foi ganhadora do Prêmio ANEFAC Profissional do Ano de 2017, na categoria Jovem Destaque.
Ainda na adolescência teve contato com uma ONG chamada projeto Pérola, de inclusão digital, acabou se tornando coordenadora de um dos programas, que era o desenvolvimento de talento jovem e percebeu que faltava crédito para essa população colocar em prática boas ideias de negócios locais, nesse projeto chegou a liderar 350 pessoas. Entre 2008 e 2009 participou de um processo seletivo na Artemísia, uma aceleradora de negócios sociais e, como uma das 5 (cinco) finalistas, foi contemplada com R$ 40 mil para iniciar seu próprio projeto. Em seguida, fundou o Banco Pérola, que dirige até hoje.
O Banco Pérola é um projeto local, que apoia empreendedores da cidade e já inseriu milhares de reais na economia de Sorocaba, em números de empréstimos foram aproximadamente 3 mil operações e R$ 8 milhões de reais. “Acredito que quanto mais o projeto crescer na região melhor será para todos e para quem precisa de dinheiro para investir no seu negócio. A região de Sorocaba é bastante focada na indústria, porém, o espírito empreendedor é muito presente na população (na minha opinião, não só aqui, mas em todo Brasil). Nosso propósito é encontrar pessoas sérias, capazes e dispostas a enfrentar as dificuldades do empreendedorismo, mas que por algum motivo não conseguem o crédito que precisam nos bancos tradicionais. Com o empréstimo esperamos ajudá-lo a alavancar o seu negócio, contribuindo com a melhoria da sua situação financeira, fazendo a economia local girar, gerando empregos e, ao mesmo tempo, desenvolvendo a autoestima e o senso de protagonismo individual”, explica.
O Banco Pérola, que possui como produtos: crédito produtivo para microempreendedores e pequenas empresas (capital de giro e investimento), cria uma ponte entre os empreendedores e investidores, pois, França avalia que os apoiadores são em sua maioria empresários que deram certo e hoje podem apoiar pequenas empresas que estão começando e que precisam de crédito. “É uma troca sadia. O nosso papel como associação de crédito é facilitar essa ligação e essa transferência de recursos de maneira sustentável para todos os envolvidos: o pequeno empresário, o investidor e o Banco Pérola”, pontua.
No início do FIDC (pode-se dizer, no projeto piloto do Banco Pérola) o recurso veio de alguns parceiros que acreditavam no trabalho (empresários de São Paulo), que investiram na causa e obtiveram um rendimento de mercado. “Por conta do sucesso da iniciativa, hoje a captação é feita por meio da gestora do fundo, a Empírica Investimentos e é exclusiva para investidores profissionais. Mas o propósito se mantém o mesmo: usar uma ferramenta de mercado, regulada pela CVM (Comissão de valores Mobiliários), para levar recurso de investidores para esse público específico de micro e pequenos empreendedores”, diz.
Uma das empresas que utilizaram recursos do Banco Pérola foi a Overture Cervejaria. “O projeto nasceu em 2010 quando começamos a fazer cerveja após ler uma reportagem em uma revista, percebemos que era possível fazer a nossa própria cerveja em casa. E mais ainda, vimos que existia um mundo totalmente novo das cervejas para ser explorado. Começamos a estudar e percebemos também que muita gente ainda não tinha descoberto o mundo da cerveja e apresentar isso para as pessoas se tornou uma meta pessoal”, conta Cézar Augusto Teixeira Paes Barreto, empreendedor. Ele aponta que muitos desafios surgiram no caminho, investimentos altos em equipamentos, empregaram toda a poupança, licenças do governo, sucessos e fracassos que serviram de aprendizado. Uma experiência que uniu toda a família Cacilda, Luciana, Eduardo e Cezar. Com a energia e dedicação montaram a própria fábrica de cervejas.
“Precisávamos expandir a nossa produção com a aquisição de um novo tanque fermentador. A maioria dos equipamentos nós fizemos por conta própria usando a nossa criatividade, só que o tanque fermentador não era possível. Precisávamos comprar. Já tínhamos investido todo o nosso dinheiro e começamos a perder oportunidades de vendas por limitação da produção. Tentamos obter recursos de todo jeito em banco privados, bancos públicos, BDNES, Desenvolve SP, e várias outras fontes de financiamento. Todos pediam garantias inviáveis maiores que o valor do empréstimo. Um deles perguntou se eu tinha uma fazenda como garantia. Quando já estava quase desistindo, recebi a ligação do Banco Pérola querendo conhecer a nossa fábrica”, explica.
Microcrédito no Brasil encontra alguns desafios estruturais
Formada em marketing com um MBA em gestão de pessoas e depois um MBA em finanças com ênfase em banking, a empreendedora avalia que com o tempo, entenderam que o microcrédito no Brasil é extenso demais e, para trabalhar com mais eficiência e assertividade, dividiram o público entre os empreendedores mais estruturados e os menos estruturados. “Para atender aos mais estruturados, conseguimos a aprovação na CVM do Pérola FIDC, um Fundo de Investimentos em Direitos Creditórios, em 2014. Parcerias para formar uma governança sólida e investidores que confiam no Pérola ajudaram e ajudam todos os dias a tornar tudo possível. Para os menos estruturados, criamos um Fundo de Empréstimos, no qual solicitamos recursos a apoiadores para emprestar aos empreendedores à menor taxa e com o maior prazo possível”, relata.
Duas coisas que ela mais acredita são empreendedorismo e inovação, pois, aliados impulsionam a economia, geram empregos e equilibram o crescimento econômico de um país; e o setor de microcrédito também precisa constantemente destes valores. “O Brasil ainda não está entre os ambientes mais favoráveis para os empreendedores, principalmente para os jovens, para as mulheres e para os mais pobres. No entanto, possuímos 30 milhões de brasileiros que possuem pequenos negócios*, por isso, existem diversos atores que trabalham para facilitar e levar crédito para esta parcela da população como por exemplo: as OSCIPs de microcrédito, as sociedades de crédito ao microempreendedor, as cooperativas e mais recentemente as fintechs”, observa.
“Todas essas instituições se deparam com desafios de regulamentação, acesso a financiamento e principalmente com a pergunta: levar crédito a um país continental? Acredito que modelos de financiamento recorrentes para estas instituições e metodologias de análise de crédito mais baratas podem a médio prazo solucionar a demanda por crédito desta população. O setor de microcrédito encontra alguns desafios estruturais como o de financiamento recorrente e de atendimento rápido e mais barato para um público que demanda de uma atenção humanizada. A resposta para estas questões pode originar um modelo escalável”, vislumbra.
Impacto social
O Banco Pérola, França explica, apoia empreendedores que geralmente não tem crédito no banco tradicional ou não tem o limite que precisa. “Além disto, temos um atendimento diferenciado para os empreendedores, queremos realmente que o pequeno se torne o empreendedor de sucesso que fará a economia girar. Por isso, nosso atendimento é humanizado. Hoje, nós contamos com parceiros que dispõem de tecnologia: sim! Mas não dispensamos o olho no olho. Em resumo, a inclusão social passa pelo acesso a capital e distribuição de renda”, finaliza.
*GEM2017/2018