Transição vem do latim transitĭo. Significa a ação e o efeito de passar de um estado para o outro. Implica em mudança. É uma ‘etapa’ entre dois estados. Muitos descrevem como o movimento de passagem entre a situação atual e o futuro ideal. A palavra transição vem sendo muito utilizada quando se fala em carreira para determinar o ponto que se está e o que se deseja chegar. Como qualquer mudança na vida, a transição profissional não é fácil e exige planejamento, além de conhecer a si mesmo.
Para que a transição profissional seja um sucesso, entre os pontos elencados por Fabiana Coelho, fundadora da Dialogus que foi palestrante no simpósio on-line da ANEFAC intitulado “Desafios e Oportunidades da Transição de Carreira”, que aconteceu dia 22 de setembro, está a busca pelo autoconhecimento. Ela conta que é necessário se preparar com muito estudo e pesquisa, controlar as emoções, não ter medo de arriscar e contar com uma rede de apoio com parceiros que sabem sobre aquilo que não somos bons. “É importante saber que não temos todos os talentos, por isso precisamos de ajuda de pessoas de confiança e que entendam de assuntos que não dominamos. Estar preparado psicologicamente para enfrentar os desafios e saber que nem tudo dará certo. Aprender com os erros e seguir em frente, sempre”, diz.
O planejamento, para Patricia Oliveira, gestora de pessoas na Russel Bedford Brasil e que palestrou no evento, precisa contemplar o preparo financeiro, porque geralmente quando se inicia numa área, os salários são mais baixos e dependendo do nível que o profissional está atualmente, será natural que a remuneração diminua. Outro ponto de atenção, ela explica que, é a capacitação técnica, ter a teoria, estudar e buscar aprimoramento na área escolhida. “O autoconhecimento também é fundamental, saber quais as suas competências, os seus pontos fortes e o que vai precisar desenvolver, isso porque quando falamos em carreira, a vontade e o desejo de fazer algo não é o suficiente, é preciso muito esforço. As palavras chaves são preparo e esforço”, alerta.
A construção da carreira no contexto atual é, na visão de Marcelo Treff, professor de gestão de pessoas na PUC-SP, outro palestrante do simpósio, um processo contínuo e de mudanças frequentes. Para fazer uma transição, ele explica que, o profissional deve mapear oportunidades, investir em aprimoramento profissional e em network. Ademais, ter clareza do que quer, fazer e alinhar esta expectativa às limitações e talentos, cuja identificação pode ser realizada por meio de exercícios de autoconhecimento.
Segundo as especialistas, não existe idade para mudar de profissão. Na opinião de Oliveira, está muito mais relacionada a competências, talentos e domínio de funções do que idade. Mas é preciso considerar que em algumas empresas, infelizmente, pessoas jovens e sem experiência ou com mais idade, não conseguem oportunidades, mas isso está mais conexo a cultura da empresa do que com a transição de carreira propriamente dita. Já Coelho acredita que, o que importa é que a pessoa queira mudar e se prepare: estude e pesquise sobre a nova carreira desejada, entenda o mercado, quais os pontos positivos e negativos, ameaças e desafios e converse com as pessoas que já atuam na profissão.
Enquanto Treff aponta que, historicamente, as transições de carreira aconteciam depois dos 40 ou 45 anos, a chamada “meia idade”, crítica para muitos profissionais em ambientes organizacionais, já para as mulheres, muitas vezes, perto dos 30, em virtude da maternidade. “Atualmente, as fronteiras da transição de carreira ou transição profissional tornaram-se mais fluídas e o novo mundo do trabalho não estabelece regras rígidas. Penso que, cada vez mais, as iniciativas de transição estão relacionadas as expectativas das pessoas com relação ao trabalho”, avalia.
Depende do tipo de transição, mas, via de regra, Treff acredita que, as novas gerações têm se arriscado mais. Em especial, Gerações Y e X. Mas, é importante analisar as especificidades, pois quando falamos de gerações em um país como o Brasil, com tantas diferenças de renda e de classe social, além das regionais, devemos tomar alguns cuidados. Portanto, as Gerações Y e Z universitárias, por exemplo, tendem a se arriscar mais quando têm a retaguarda da família.
A transição de carreiras também não está relacionada as competências, mas sim ao autoconhecimento. A partir isso, Coelho pontua, que ela vai se dedicar para ampliar suas competências, mas uma das mais requisitadas atualmente é o “learnability“, ou seja, a capacidade de aprendizado, saber adaptar e desenvolver os conhecimentos ao longo da vida. Ao complementar, Oliveira cita, assumir as fraquezas e ressaltar as qualidades são um ótimo exercício. Assim como a capacidade de reconhecer suas características e trabalhar para desenvolver pontos fortes é fundamental. Existem profissionais no mercado que auxiliam neste autoconhecimento e conseguem orientar na identificação do perfil de cada pessoa.
“Medir competências é sempre uma missão muito difícil, porque depende de contexto e, sobretudo de individualidades. No entanto, de uma forma geral, as exigências mesclam vários saberes: o saber, o saber-fazer e o saber-ser, ou seja, competências técnicas, específicas de determinado contexto, e sociais ou socioemocionais, como adaptabilidade, resiliência e orientação para o autodesenvolvimento”, relembra Treff. Quando o assunto são as oportunidades, para ele, as principais estão relacionadas à abertura para o novo: novos aprendizados, novas relações e perspectivas, além da possibilidade de ampliação da visão de mundo (weltanshauung).
É uma descoberta, pondera Oliveira, de novas competências e habilidades que estavam “adormecidas” ou que não eram necessárias até o momento. Na transição de carreira, em geral, os profissionais, por já terem atuado em outras áreas, encaram o desafio com mais maturidade, que é uma soft skill importantíssima para a formação dos bons. Coelho observa que, se a pessoa estiver preparada e com o coração aberto será um mundo de descobertas e oportunidades, pois é o momento de ver o mundo de outra forma, diferentes perspectivas, pessoas com perfis variados e aprendizado constante.
Oliveira já passou por uma transição de carreira na Russell Bedford Brasil. “Sou formada em Ciências Contábeis e atuei em auditoria externa por sete anos, em fevereiro deste ano fui convidada pelo CEO para assumir a Gestão de Pessoas. Sempre digo que fui privilegiada em fazer essa transição onde estava, contei com o apoio e compreensão dos colaboradores e dos pares, todos me conheciam e tive muito incentivo nesta nova etapa. Na Russell tivemos outro caso recente, em São Paulo, uma colaboradora da parte administrativa que iniciou os estudos em Ciências Contábeis e fez a transição de carreira para auditoria contábil”, relata.
Movimento aumentou com as condições de trabalhos atuais, mas já está no mercado há tempos
Há anos vem ocorrendo um aumento significativo de novas carreiras e, consequentemente, oportunidades. Ademais, Treff conta que, a flexibilização das relações de trabalho também cria permanentemente novas alternativas de trabalho. Atualmente, as carreiras deixaram de ser lineares e, assim, tornaram-se representações das decisões tomadas pelos indivíduos nos mais variados contextos de suas vidas e ambientes em que estão inseridos.
O mundo já vinha em processo de mudanças e a pandemia apenas acelerou essas transformações, inclusive impactando a carreira de muitos profissionais. “Com o trabalho remoto, acesso à informação, vivências diferenciadas e novos olhares sobre o mundo durante mais de um ano, as pessoas estão repensando sua vida e sua carreira. Ou seja, estamos vivendo um novo momento e a transição de carreira parece que faz sentido e se mostrou uma oportunidade real para muitas pessoas”, ressalta Fabiana Coelho.
Com certeza, de acordo com Patricia Oliveira, hoje o tema transição de carreira está muito em evidência, as próprias empresas incentivam e fazem programas internos para os seus colaboradores. Outro fator, ela cita, que tem influenciado o aumento de casos, são os profissionais mais jovens entrando com características de multidisciplinaridade, o mercado tem exigido essa flexibilidade e conhecimento mais amplo e, com isso, é natural que acabem se interessando por outras áreas e fazendo esse processo.
Temos visto que muitas pessoas, principalmente de grandes cidades, decidiram mudar radicalmente de vida. São conhecidos como nômades digitais: resolveram se mudar ou viajar e trabalhar de forma remota. Alguns, Coelho entende que, conseguiram fazer mantendo o emprego que já tinham. Negociaram menos horas e salário menor, e ganharam autonomia e qualidade de vida. Outras resolveram investir num negócio próprio, seja uma startup ou um restaurante. E uma boa parte está no processo de reavaliar a carreira e se preparar para o processo de transição.
Não adianta esperar pelo momento ideal. O equilíbrio está em não esperar tanto a ponto de ele nunca chegar, e nem ser tão precipitado. É preciso mapear os grandes riscos, ter disposição para enfrentar e não perder o “timing” para essa transição”, finaliza Emerson Dias, head de Capital Humano da ANEFAC e consultor de carreira, que mediou o simpósio on-line da ANEFAC intitulado “Desafios e Oportunidades da Transição de Carreira”.
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