As oportunidades estão na cadeia gerada pelo M&A’s, que vai desde consultoria a implantação de sistemas. Os setores de saúde e varejo estão nas grandes apostas
À espera de estabilidade do cenário brasileiro e internacional, mercado de fusões e aquisições, popularmente conhecidas como M&A’s (Mergers and Acquisitions), no Brasil começa a dar os primeiros sinais de recuperação. Em épocas de crise, é muito comum grandes empresas e grandes fundos, principalmente estrangeiros, preservarem caixa. Aquecido neste começo de ano, com uma série de operações anunciadas, esse mercado ainda deve demorar a se recuperar totalmente dos efeitos provocados pela Covid-19. Na visão de Bernardo Lopes, executivo da BDO, que palestrou no Congresso ANEFAC Digital 2021, as fusões e aquisições ficaram paradas durante 2020, mas o 1º trimestre desse ano já se mostrou o melhor da última década.
“Sentimos que os nossos negócios dobraram nos procedimentos de aquisições e fusões. Durante a maior parte da pandemia essa demanda ficou retida, mas agora começa o retorno gradual. Como é uma necessidade natural deste mercado, o investidor busca estabilidade. Entramos num cenário de vacina existente e isso já mais ou menos começa a se direcionar neste sentido, por mais que haja oscilações, é possível ter uma previsão. Se falamos de empresas, elas têm esse mesmo pensamento. É fato que nas incertezas todos tendem a segurar caixa. Por exemplo, como aconteceu com a controladora da Louis Vuitton e da Bulgari, a LVMH, que vinha no processo de aquisição da Tiffany & Co. e durante a pandemia ficou parado, assim se sucedeu com inúmeras operações. Mas depois dessa previsão de melhora as empresas voltaram a fazer negócios”, explica Lopes.
A pandemia acabou criando oportunidades também quando o assunto são as fusões e aquisições. As vezes o problema de uns é oportunidade para outros. Com o isolamento social, algumas empresas tiveram dificuldades de caixa, assim como o seu valor de mercado diminuiu, mas por um lado, segundo Lopes, aquelas que tinham situação financeira positiva viram uma oportunidade para comprar uma empresa com um valor mais baixo e alavancar. O que realmente não está acontecendo são aquelas aquisições milionárias, as mais arriscadas. “O setor que o M&A está acontecendo com maior intensidade é no varejo, a própria Magazine Luiza vem adquirindo várias pequenas empresas, principalmente startups de tecnologia, por causa da criação do aplicativo SuperApp Magalu. Assim como o Banco Inter está realizando pequenas aquisições para ofertar diversos serviços. Além do BTG que está comprando corretoras e fundos de investimentos para aproveitar e crescer. São empresas grandes com caixa estável”, analisa.
Outra questão, que o especialista entende, é que a pandemia impactou no valor das companhias. Mas o grande problema, e que já é antigo, historicamente principalmente no Brasil e na América, é com relação ao preço de compra e de venda. No M&A é preciso chegar num meio termo, um valor que é bom para as duas partes. Hipoteticamente, não adianta o valuation constatar R$ 200 mil se o vendedor quer R$ 400. Por questões culturais há sempre esta discussão entre as partes. As vezes negócios são perdidos por não haver entendimento do que realmente vale a empresa no mercado. “Em tempos atuais, efetivamente, do lado do comprador, o maior desafio é fazer uma aquisição e comprometer o caixa, pois o cenário ainda é de risco. Já do vendedor, o risco é ainda maior, pois ele foi penalizado imensamente pela pandemia, perdeu caixa e o valor da sua empresa despencou, muito mais nas empresas de médio porte, que justamente são aquelas compráveis. Se conseguiram sobreviver, o seu valor as vezes é menos da metade de antes. Por outro lado, precisam de investimento para continuar operando, e isso quer dizer ter um novo sócio”, pontua.
As oportunidades da cadeia do M&A
Pode-se dizer que as fusões e aquisições sempre geram oportunidades, pois o buy side (comprador) consegue ampliar produtos, regiões e aumentar a produção. O sell side (vendedor) captar um sócio ou fazer parte da consolidação. Vale lembrar que o Brasil antes da pandemia bateu o recorde de M&A dos últimos 27 anos, segundo dados de um estudo sobre o setor. Para Lopes, existe uma série de oportunidades dentro do que se chama a cadeia do M&A, de pronto o due diligence, assessoria (para comprador e vendedor) e avaliação de empresas. Depois de fechar o negócio, tem o plano de 100 dias, que é o processo de juntar as duas empresas em uma só e isso envolve muitos desafios como gestão de cultura, implantação de sistemas, realização do purchase price allocation (PPA) e de auditoria, assessoria tributária, assessoria de governança corporativa e muitos outros. A cadeia é imensa.
Entre os setores que mais podem ocorrer as fusões e aquisições nos próximos anos, o destaque vai para o de saúde, que já vinha em ampla consolidação. “Não está relacionado diretamente com a pandemia, mas sim porque o setor é bastante pulverizado. Em muitos casos, clínicas, centros de diagnósticos e hospitais são de médicos ou cooperativas destes profissionais. O movimento que vinha acontecendo era que alguns players fizeram muitas aquisições como a Rede D’Or e a Hospital Care. Ainda temos a saúde dos pets com clínicas, hospitais etc. que, provavelmente, deve ser o próximo, inclusive com as grandes de saúde entrando neste mercado. O que devemos ter então é a consolidação do setor de saúde. Com certeza teremos na frente algumas empresas que irão dominar o setor comprando as menores. Só deveremos ter alguns grandes players operando no Brasil e oferendo o serviço como aconteceu em outros setores”, vislumbra Lopes.
Além disso, temos o varejo, onde a situação é um pouco diferente. A pandemia acelerou a questão tecnológica. Havia alguns e-commerce nascendo, mas aos poucos. Existia muito a cultura de ir à loja física e ver o produto. Com o isolamento social, as empresas precisaram acelerar o seu e-commerce e, para isso, compraram startups que tinham o sistema para vender on-line. Mas não só isso, por trás há todo um sistema de interligação das demais áreas da empresa. O TI dominou a área. Hoje, existe o marketplace, que é uma plataforma que conecta oferta e demanda de produtos ou serviços, reúne vendedores ou prestadores. Tudo digital. Vale lembrar que as startups não são bem empresas. Elas têm potencial, mas muitas vezes não tem dinheiro. Quando o dinheiro dos sócios acaba, entram os fundos de investimentos neste mercado. Eles apostam numa ideia e põe capital, mas nem todas sobrevivem. Mas são apostas.
O especialista da BDO aponta algumas dicas para as empresas que estão pensando em comprar e vender como a contratação de uma assessoria, pois não adianta uma empresa querer fazer os processos de aquisições e fusões e não estar apta. E completa: as médias e pequenas não tem necessidade de legislação específicas e os seus processos as vezes são ruins, então é preciso simular um due diligence para arrumar a casa. As vezes isso influencia no valor direto da empresa. Os principais problemas são a falta de auditoria mesmo a interna, inexistência de controles, passivo trabalhista e as questões tributárias estão completamente irregulares.
Para finalizar, Lopes avalia as questões tecnológicas nas negociações de fusões e aquisições, que estão diretamente ligadas ao Virtual Data Rooms, que facilita bastante o processo. Antigamente a empresa abria uma sala e colocava os documentos, de um tempo para cá todo esse processo acontece on-line. A documentação está na nuvem. “As empresas de tecnologia se destacam nesse sentido, pois se tornaram atrativas”, diz.