Por Emerson W. Dias, vice-presidente da ANEFAC*
A humanidade passa por um período singular, mas, Klaus Schwab, fundador do Fórum Econômico Mundial, em seu livro a Quarta Revolução Industrial, nos conta que: “Os níveis exigidos de liderança e compreensão sobre mudanças em curso, em todos os setores são baixos quando contrastados com a necessidade em resposta à quarta revolução industrial, de repensar nossos sistemas econômicos, sociais e políticos. O resultado disso é que, nacional e globalmente, o quadro institucional necessário para governar a difusão das inovações e atenuar as rupturas é, na melhor das hipóteses, inadequado e, na pior, totalmente ausentes”.
É um texto que soou estranho, pois liderança é um dos temas mais discutidos em publicações por aí afora, centenas de conteúdos são despejados no mercado o tempo todo, com ou sem relevância acadêmica ou prática, é uma verdadeira indústria da liderança, que se materializa também em cursos, palestras, treinamentos, imersões das mais variadas possíveis, mas mesmo assim, continuamos tendo problemas com as lideranças?
Isso porque existe uma enorme distância entre os atributos desejáveis nos líderes e os que de fato os levam ao poder, boa parte da literatura de negócios fala sobre um mundo idealizado, baseado em esperança e não na realidade. Em 2013, tive acesso há uma pesquisa, intitulada “O que as empresas precisam e os chefes não têm”, o estudo revelava que “as características mais desejam para os seus líderes não eram as mais encontradas nas empresas”. Por exemplo, a capacidade de desenvolver pessoas, citada como uma das mais desejadas pelos executivos (88%), mas menos de 1/3 deles admitia que sua equipe possuía tal habilidade.
Isto me inspirou a escrever o livro: O inédito viável na gestão de pessoas, reflexões e filosofia prática sobre liderança publicado em 2015. O livro contém ferramentas para ajudar líderes a exercerem uma liderança focada no desenvolvimento da equipe.
Porém a frase do Schwab em 2016 me intrigou, decidi estudar o tema liderança mais profundamente, procurei desde os antecedentes históricos do Egito Antigo, chegando as teorias acadêmicas, que entram na vida das empresas apenas no início do século XX.
O primeiro achado da pesquisa é que assim como o amor, a liderança continua a ser algo que todos sabem que existe, mas ninguém pode definir, exatamente, o que é, não há uma definição única, entende-se que a liderança eficaz é o motor para que as coisas de fato aconteçam, as realizações mais relevantes da história estão diretamente associadas a pessoas que influenciaram outras a alcançarem objetivos, mas não podemos enxergar a liderança como uma habilidade pessoal, mas como um processo interpessoal dentro de um contexto complexo, onde vários elementos estão presentes. Não é só atributo da pessoa, mas a combinação dos elementos: características do líder e dos liderados, a missão ou tarefa a ser realizada e a conjuntura social, econômica e política vivida num determinado ponto da história.
As teorias iniciais sobre liderança remontam os anos de 1850, quando estudiosos analisavam em detalhes líderes bem-sucedidos, passando pelas teorias dos traços de personalidade, entendidos como o padrão de comportamento quando da direção de atividades de outros, o que alguns autores denominaram estilo. Os estilos podem ser mais voltados à tarefa ou às pessoas, autocrático ou democrático. Porém, o que funciona bem para trabalhadores de um determinado setor pode não funcionar para outro, as características do seguidor e os fatores situacionais do contexto precisam ser adicionados a esta equação, assim surgem as teorias contingenciais, sendo a mais famosa a liderança situacional.
Já nos anos 70 e 80, surgem as teorias da liderança transacional e transformacional. Transacional ocorre quando há recompensa ou disciplina, dependendo da performance do liderando, enquanto que a transformacional ocorre quando uma ou mais pessoas se envolvem com os outros de tal forma que líderes e seguidores se elevem uns aos outros para níveis mais altos de motivação e moralidade, que converte seguidores em líderes. Depois disto, surgiram teorias consideradas menores, como liderança servidora, autêntica e abordagens de inteligência emocional na liderança, teoria do mindset entre outras.
Na testagem prática, optei por avaliar os estilos da liderança (pessoas, tarefa ou contingências), e identificar se os líderes eram mais transacionais ou transformacionais. Tentando evitar o viés cognitivo, resolvi avaliar a percepção dos liderados, ou seja, ao invés dos próprios líderes se auto avaliarem, perguntei aos liderados como eles percebiam seus líderes.
Os respondentes formaram um total de 64,7% de homens e 35,3% de mulheres, porém, quando se olha a composição da liderança, os homens ocupam 76,6% das posições, representando a grande maioria em relação às mulheres que possuem apenas 23,4% deste total.
Esta amostra é bastante consistente com pesquisas de mercado, que dependendo da fonte, apresenta entre 30% e 20% das posições de liderança ocupadas por mulheres. Ou seja, nós, assim como o mercado, ainda estamos com número desproporcional entre população total de mulheres na sociedade e sua participação nos cargos de liderança dentro das organizações.
O estilo Situacional aponta ser o mais dominante na amostra, porém, como ela não é probabilística, não se pode generalizar os resultados para o universo, o estudo revela que nosso foco é mais nas questões situacionais e tarefa, muito embora, no geral a avaliação feita pelos liderados sobre seus líderes seja bastante positiva.
Talvez isto explique, o porquê quase não haver diferença entre os líderes transacionais e transformacionais, não podemos assumir uma predominância, porém, o estudo revelou uma forte correlação positiva entre relacionamento e transformacional e relacionamento e transacional.
Percebeu-se que há diferenças significativas quando os gêneros dos líderes e dos liderados são considerados ao mesmo tempo.
De acordo com o gráfico abaixo, os maiores escores ocorrem nas avaliações de mesmo gênero, sejam quando liderado homem avalia líder homem ou quando liderada mulher avalia líder mulher, enquanto os menores escores ocorrem nas avaliações entre gêneros, quando liderado homem avalia líder mulher ou quando liderada mulher avalia líder homem.
Nota-se ainda que os menores escores ocorrem exatamente quando lideradas mulheres avaliam líderes homens, com exceção ao fator Situacional.
Em relação a avaliação intergeracional, considerando o cruzamento das gerações entre ambos, o resultado é mostrado nas tabelas abaixo:
Geração | |||
Porcentual de liderados | Porcentual de líderes | ||
Baby Boomers (nascidos entre 1945 e 1967) | 18,6 | 28,4 | |
Geração X (nascidos entre 1968 e 1979) | 34,8 | 47,5 | |
Geração Y (nascidos entre 1980 e 1991) | 38,4 | 23,4 | |
Geração Z (nascidos entre 1994 e 2010) | 8,2 | 0,7 | |
Total | 100,0 | 100,0 |
A hipótese testada trouxe uma visão interessante e pouco usual no senso comum em relação ao estilo Tarefas. Onde liderados da geração baby boomers avaliam com escores mais altos os líderes da geração Y. E os liderados da geração Z, avaliam os líderes baby boomers da mesma forma, conforme apresenta o gráfico abaixo:
Outras descobertas foram feitas, e a estatística descritiva trouxe uma composição estratificada da população, mas por hora temos bastante material para buscar entender e melhorar nossa liderança. Como trabalho científico fico satisfeito com os resultados, pois se negarmos a realidade em vez de entendê-la nunca vamos conseguir avançar. Por isso, é preciso investir recursos e continuar esta pesquisa inédita que se mostrou bastante viável.
*Emerson W. Dias é vice-presidente de Capital Humano da ANEFAC