Erving Goffman escreveu na década de 60 um livro chamado: Estigma, notas sobre a manipulação de Identidade Deteriorada. A palavra estigma vem do grego, significava um sinal corporal feito com faca ou fogo que marcava os escravos e criminosos, de modo a serem imediatamente detectados na sociedade. No pensamento Goffmaniano, o indivíduo estigmatizado é aquele cuja identidade social real mostra atributos que desagradam às expectativas de “normalidade” de um grupo social.
Estigma, de forma simples, é cicatriz, como a que carrega no rosto o lutador brasileiro de MMA José Aldo, consequência de uma queimadura ocorrida na infância, que lhe rende o apelido de scarface (cicatriz em inglês). Scarface é também um filme policial da década de 80, escrito por Oliver Stone, dirigido por Brian de Palma e estrelado por Al Pacino e Michelle Pfeiffer, onde Tony Montana, o personagem de Al Pacino, tem uma marca no rosto, vive a história de um cubano, cheio de marcas do passado, que aporta em Miami e se torna o maior traficante de drogas dos Estados Unidos.
E, falando em marcas, um jovem gerente chega à empresa. Rapaz “bem-apessoado”, terno bem cortado, gravata alinhada, rosto liso em todos os contornos, diziam que ele fazia a barba duas vezes ao dia para não aparentar cansado, ele cuidava de sua marca pessoal como ninguém.
Logo nos primeiros dias fez uma limpeza geral no escritório: quadros, vasos e espelhos compunham o novo design do departamento de contabilidade.
Tinha horror a papelada espalhada nas mesas, era um sujeito “limpinho” como diziam pelos corredores, menino de bochechas rosadas, vê-lo era lembrar da embalagem das balas Juquinha, “um fofo”, parecia que tinha sido arrumado pela mamãe todas as manhãs.
Todos os dias encontrava algo que poderia melhorar na estética do ambiente, mesmo que fosse na vida particular de alguém. Paulo, alinhe esta gravada. Joana, muito batom. Cleber menos graxa nesse sapato, isso não disfarça o tempo de uso dele, dizia o jovem entendido de “branding”.
Cismou então com a barba de seu Osvaldo, que tinha o apelido de Barba Ruiva, senhor de meia idade, barba longa, um pouco desgrenhada – era verdade -, sempre tímido e retraído, os colegas sabiam muito pouco da vida daquele analista sênior dedicado.
Na sua visão, Osvaldo, estava destoando da equipe no quesito aparência, não contribuía para a criação da marca, da identidade visual, que ele tanto pregava. Dia após dia o chefe jogava indiretas, olhava para Osvaldo, os colegas riam, até que seu Osvaldo, cansado, resolveu fazer a barba, coisa que nem aqueles que já estavam há décadas na empresa havia presenciado.
Apareceu então seu Osvaldo na segunda-feira, de barba feita e um detalhe então escondido vinha à tona: uma enorme cicatriz no rosto.
Cicatriz que remetia um passado distante que ele não gostava de comentar, e que a barba ajudava a reduzir os olhares curiosos, seguidos de questionamentos pelos quais ele detestava passar.
O chefe, o RH e os colegas engraçadinhos tinham então percebido o tamanho da besteira que haviam feito e que seu Osvaldo, por receio de dialogar para expor sua situação, acabou aceitando.
É comum ouvirmos que todos querem deixar sua marca, desde a Grécia antiga, marcas pessoais são marcas, mais ou menos profundas, e qual marca o jovem gerente nos deixou?
Qual cicatriz foi maior e qual era o verdadeiro estigma?
Se você tem um causo inusitado, engraçado ou curioso envolvendo o mundo corporativo para contar, envie para esta coluna pelo e-mail comunicacao@anefac.com.br, que nosso lorde está pronto para escrachar. Mas pode ficar tranquilo, como todo lorde que se preze, Lord Excrachá é discreto. (Importante: As identidades dos colaboradores desta coluna não serão divulgadas.) Lord Excrachá é criação de Emerson W. Dias, diretor de Liderança e Gestão de Pessoas da ANEFAC e fundador do portal e da série de livros O Inédito Viável.