Por Ciro A. Fernandes, doutor em administração e professor universitário
O bom desempenho do conselho de administração pode elevar o grau de confiança dos investidores, e com isso criar um ambiente propício à atração de recursos externos, permitindo a sobrevivência da empresa, o bom funcionamento da economia e do mercado.
No entanto, o desempenho dos conselhos de administração está diretamente relacionado às competências de seus membros, o que enseja um novo olhar das empresas no momento de escolher os novos conselheiros.
Todavia, muitas empresas ainda não se deram conta de que as competências individuais podem ser um diferencial no desempenho do conselho, optam por indivíduos que tenham sido indicados por determinado grupo de investimentos, persistindo em escolher nomes, sem critérios que comprovem capacidades para exercer a atividade.
Essa prática recorrente e usual se dá a partir de vários motivos, alguns deles são: as trocas de favores, a imposição de um grupo de investidores e a amizade que pode haver entre o indicado e outros diretores.
Havendo esse tipo de critério de escolha, o desempenho do conselho pode ser comprometido e com isso, colocar em risco as estratégias definidas pela empresa. O conselheiro escolhido pode atuar de maneira parcial, dando preferência às necessidades do grupo que representa ou não ter capacidade intelectual e profissional para o desempenho da atividade, prejudicando o processo de tomada de decisão, influenciando negativamente o julgamento dos investidores quanto à aplicação de novos recursos na empresa.
É necessário deixar claro que a indicação é uma prática regulamentada pela Lei das S.A. nº 10.303/2001, em seu artigo 141, que trata das condições de eleição de conselheiros (BRASIL, 2001) e faculta aos acionistas, com direito a voto, a escolha do conselheiro de administração.
A indicação pode permanecer como está. Todavia, levando-se em consideração as características individuais relevantes ao exercício da atividade de conselheiro de administração, o oposto disso revela-se um modelo restritivo para lidar com a realidade contemporânea do mercado de capitais.
Isto posto, há que se repensar a forma de escolha do conselheiro de administração. Deve-se privilegiar um modelo em que as competências profissionais do indicado se sobreponham aos interesses particulares e propor um novo paradigma, dentro do qual os conselheiros cumpram efetivamente seu papel de agente estratégico, responsável pela criação de valor para a empresa.
Um conjunto de características individuais relevantes ao exercício da atividade de conselheiro de administração está proposto no quadro 1
Fonte: Fernandes (2018)
As características apontadas no quadro 1, emergiram ao longo de pesquisa realizada em tese de doutoramento, a qual teve por objetivo conhecer as características individuais relevantes à atividade de conselheiro de administração. A pesquisa abordou sete características, a saber: atuação independente, credibilidade, conhecimento do ambiente de negócio da empresa, habilidade para negociador, postura proativa, tomada de decisão, trajetória e o acúmulo de experiências.
Ressalta-se que as características foram determinadas após intensa revisão da literatura e submetidas à apreciação dos 30 participantes da pesquisa (15 presidentes de conselhos de administração e 15 conselheiros, de grandes empresas) sendo que todos foram enfáticos em reconhecê-las como essenciais ao exercício da atividade de conselheiro de administração, portanto, validas à pesquisa.
Apesar da relevância que possuem as sete características, três demonstraram ser condição sine qua non ao perfil do candidato, ou seja, sem qualquer delas o indicado à atividade de conselheiro de administração não terá condições de desempenhar suas obrigações junto ao conselho.
Das três características que se apresentam como necessárias a atividade de conselheiro de administração a experiência apresenta-se como sendo um atributo que torna o conselheiro ponderado no momento da tomada de decisão, mais persistentes na implementação das estratégias e maior discernimento individual.
A experiência também contribui com a capacidade de se tomar decisão utilizando experiências vivenciadas, que auxiliam na construção de modelos mentais e permitem a combinação das escolhas estratégicas com a compreensão do ambiente de negócios.
Também a partir das experiências profissionais surge uma postura mais confiante, necessária ao manifestar-se durante as reuniões do conselho. Outra característica que se destaca é a credibilidade. A consciência ética surge nos atributos requeridos aos conselheiros de administração, sendo condição ímpar para o exercício da atividade.
A postura íntegra, a coragem e a adesão a valores e princípios morais podem salvar uma empresa e sua reputação. A um Conselho de Administração não pode faltar integridade, pois isto vai de encontro às boas práticas de governança corporativa e desperta a desconfiança dos investidores.
A última característica de destaque é a atuação independente. A atuação independente é uma característica que denota coragem e respeito aos investidores e à companhia, uma vez que o conselheiro deve decidir com imparcialidade e foco no desempenho do conselho e da empresa.
Algumas recomendações sobre a atuação independente são feitas para se evitar conflitos de interesse, como no caso em que IBGC (2009) recomenda que os conselheiros independentes não tenham participação relevante no capital, pois há o risco de o conselheiro passar a atuar como acionista. Essa situação pode comprometer a independência do conselheiro e causar conflitos se o conselheiro não se posicionar de maneira coerente com os objetivos de crescimento da empresa e dos investidores.
Ressalta-se que no momento de se posicionar, o conselheiro não deve prestigiar os interesses de quem o indicou em detrimento aos interesses da empresa, espera-se que o conselheiro tome suas decisões de maneira clara, assertiva e com imparcialidade, demonstrando sua independência em relação ao grupo que o indicou.
Por fim, resta dizer que todas as características são complementares uma das outras, como por exemplo, se o candidato a conselheiro tiver uma determinada característica complementada por sua trajetória e experiência profissional, isso permitirá uma maior assertividade na tomada de decisão estratégica.
As demais características: formação acadêmica, gênero, idade, alcance de resultados, reconhecimento no mercado, competência da comunicação, conhecimento do ambiente de negócio da empresa, conhecimento da realidade internacional e nacional, habilidade em análise, habilidade para negociar, disposição a cooperar, liderança entre iguais, postura proativa e tomada de decisão, apesar de importantes, em um primeiro momento, não são características que possam ser consideradas como determinantes ao perfil do conselheiro, visto que podem ser aprendidas ou estimuladas pelo presidente do conselho já no início do mandato do conselheiro.
Em suma, uma nova postura por parte das empresas no momento de escolher seus conselheiros de administração, demanda uma observação mais detalhada no que se refere às características nominais, cognitivas e comportamentais dos indicados ao conselho. Uma vez escolhido por suas competências, o conselheiro de administração terá maior capacidade de colaborar com a organização (FERNANDES, 2018).
Referências
FERNANDES, C. A. Características individuais relevantes à atividade de Conselheiro de Administração. Tese (Doutorado em Administração). Programa de Pós-Graduação em Administração, Universidade Municipal de São Caetano do Sul, São Caetano do Sul: 2018.
IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. Código das melhores práticas de governança corporativa. 4. ed. São Paulo: IBGC, 2009.