O mundo vem acompanhando, nas últimas semanas, o surgimento de uma pandemia, que gera preocupações e cautelas por parte da população de diversos países. Um dos efeitos verificados é a tendência de grande parte da população evitar contatos com outras pessoas para reduzir a velocidade de contágio. Escolas enviaram os alunos para casa, eventos foram cancelados e, finalmente, muitas empresas autorizaram o home office.
Notícias negativas à parte, talvez seja hora de ver a parte de copo meio cheio. Pode ser esse, finalmente, o empurrão que estávamos precisando para aprender a trabalhar, de fato, de forma remota. Quando houve a disseminação da internet no final dos anos 90, a ideia do home office e dos times virtuais ganhou corpo, havia uma promessa de ganho de produtividade, redução de custos, melhor qualidade de vida e a possibilidade real de criação de times globais.
Entretanto, por questões culturais, legais e de infraestrutura tecnológica, seu avanço foi menor que se imaginava. Parecia estranho trabalhar “de pijama” e sem bater cartão, mantendo a concentração no trabalho e sem se distrair com as tentações de casa. Para muitos superiores, a desconfiança em não saber se os funcionários estavam ou não trabalhando naquele momento. Incertezas em relação ao marco regulatório também existiam. E, para piorar, nem sempre as conversas virtuais (videoconferências e afins) funcionavam. A crise das empresas “ponto com” foi um dos reflexos desse fenômeno.
Com a evolução da qualidade de infraestrutura e regulamentações legais, começamos a ver muitas empresas já nascerem com o conceito de trabalho remoto, colaboração e gestão ágil, isso com o uso de ferramentas, especialmente, desenvolvidas para esse contexto. E como ficam as empresas tradicionais? O que podem aprender com essa experiência?
Baseados em boas práticas de organizações e literatura sobre o tema, selecionamos, a seguir, algumas dicas para aproveitar ao máximo o trabalho de casa:
Organize-se.
Programe atividades e tenha controle sobre elas, não é porque você está em casa que não precisa ter uma rotina. É importante demarcar espaços na agenda para as atividades e ser rigoroso com seu empenho nelas.
Os prazos de entrega não mudam, estando você no escritório da empresa ou na beira da piscina. Evite a procrastinação e faça as coisas que devem ser feitas nos devidos prazos.
Defina metas diárias realistas
Uma boa medida para saber se você está sendo produtivo é estabelecer metas diárias de tarefas a serem concluídas e ao final do dia fazer o balanço do seu percentual de realizado versus planejado.
Reduza as distrações
Não deixe as tarefas da lavanderia, limpeza, consertos e reparos consumirem seu dia de trabalho. Você deverá também se precaver contra interrupções sociais, a medida em que algumas pessoas possam pensar que, pelo fato de estar trabalhando de forma remota, você poderá fazer o que quiser a qualquer horário do dia
E as crianças?
Caso tenha filhos, provavelmente eles também estarão em casa e podem demandar atenção. Aqui, a nossa recomendação é planejar um revezamento com quem estiver em casa, seja seu cônjuge, funcionários ou os dispositivos eletrônicos (videogames, tablets, computadores e TV). Avós são grupo de risco, e só devem ficar próximos das crianças em caso de certeza que elas não tenham possibilidade de estarem contaminadas. Aproveite também para reservar algumas horas do dia para ficar com elas.
Lar doce lar
Tenha sempre em mente que você também está em casa, vale lembrar que a casa deveria ser antes de tudo o porto seguro, esse é o conceito de lar doce lar. Então, lembre-se também de “ir pra casa” e descansar. Tenha seus momentos de descanso, lazer e entretenimento garantidos na agenda. Você não vai mais chegar em casa e ligar o notebook para trabalhar porque simplesmente você nem saiu de casa, mas o notebook estará lá e ligado. Resista a tentação de trabalhar 24 horas por dia. Recompense a produtividade: se você foi produtivo por uma hora ou duas, tire 15 minutos para preparar um bom café, caminhar ou fazer algo que goste.
Tenha um office na sua home
Tão importante quanto o trabalho a ser feito é o local onde será feito. Muitas pessoas têm cadeiras ergométricas, mesas reguláveis, boas telas, internet rápida etc, mas só na empresa, em casa elas improvisam. Não é muito confortável trabalhar o dia todo sentado na cadeira de praia improvisada na varanda. A luz que bate na tela vinda da janela sem cortina e a falta de um ar condicionado no verão podem ser fatores de improdutividade, mas é normal só descobrir tudo isso depois de ter que trabalhar de casa pela primeira vez. Pode ser desagradável descobrir que internet é lenta para vídeos, downloads, o celular não tem sinal, e que o cachorro não para de latir durante a videoconferência. É importante saber que as condições de entorno afetam o desempenho, portanto, tenha infraestrutura e condições de trabalho.
Seja consistente
Vista-se de forma adequada. Pode até ser tentador, dependendo da reunião virtual estar mais confortável. Agora, lembre-se: você está trabalhando. Portanto, nada de ficar sem camisa, vestir-se da cintura para cima e deixar o pijama por baixo. Você pode esquecer deste detalhe durante a reunião e ao se levantar revelar este nada agradável visual.
Busque interações sociais com o uso da tecnologia
Você pode (e deve) reduzir a distância física sem comprometer a interação social. Se estiver se sentido muito solitário, isso é um mau sinal. A enorme maioria dos trabalhos são colaborativos, e você pode fazer isso de casa. E abuse da tecnologia. Há diversas ferramentas para videoconferências (Skype, Hangouts, Zoom, Webex), e para trabalhos colaborativos (Google Docs, Trello, Slack e Microsoft Teams, entre outros). Se não conhece ainda, tente explorar a potencialidade dessas ferramentas. Até o momento em que escrevemos esse texto, Google e Webex já tinham anunciado o uso gratuito de suas versões, por conta da pandemia. E, para as crianças, muitas TVs por assinatura, como a NET, abriram o sinal dos seus canais especiais.
Sempre que o tema é comportamento humano, vale lembrar que existem variáveis que dependem de nós e outras sobre os quais não temos a menor gestão, mas que impactam nosso comportamento. O momento é prova disto. Lavar as mãos, evitar aglomerações depende de nós, o vírus viajando pelos ares e bater em nossa porta, não temos como gerenciar.
Se por um lado, em uma crise anterior aprendemos a usar álcool gel, produto que até então muita gente sequer sabia que existia, hoje isso se tornou cultural. Raramente existem espaços onde o produto não esteja lá esperando para ser usado. Até muitas pessoas carregam consigo um pequeno frasco. Jovens estudantes criaram uma moda de pendurar seu frasco fora da bolsa e eles vêm das mais variadas formas e cores.
Isto foi incorporado ao hábito de todos nós, porque fomos obrigados a aprender que era algo importante. Assim, podemos ver que tudo aquilo que não depende de nós, também pode nos ensinar e ser incorporado em nossos hábitos. Se você não é muito apegado ao trabalho feito em casa, talvez tenha aí a grande oportunidade de adquirir esse hábito, pois o futuro será esse.
Agora quer saber algo curioso? Antes da 1ª Revolução Industrial, por volta do ano de 1750, as pessoas não saiam de casa para trabalhar, não havia fábricas, escritórios, a vida era rural e havia pequenas manufaturas nas casas. Somente com o advento das indústrias em larga escala que o mundo se urbanizou e as pessoas tiveram que sair para trabalhar fora. Portanto, o que se aprendeu, também pode se desaprender e aprender diferente. Num momento onde a virtualização do fazer vem dominando o mundo do trabalho, é bom prestar atenção nesta crise e tirar algumas lições dela.
O artigo é de autoria de David Kallás, que é head de administração, e Emerson W. Dias, que é VP de Capital Humano, ambos da ANEFAC.