Mudança da economia tradicional do mercado de propriedade (market for ownership) para o de acesso temporário (access-based consumption) é tendência
Diante do crescimento da tecnologia streaming no Brasil, com a finalidade de aumentar a arrecadação tributária e suprir os repetidos déficits orçamentários, há alguns anos estados e municípios têm buscado, cada um ao seu modo e de acordo com sua esfera de competência, regulamentar a incidência de tributos sobre essa forma de uso da internet. “A popularidade dos serviços como Netflix e Spotify despertou a atenção do Estado na busca pela competência e capacidade tributária para regulamentar a incidência de tributos sob os serviços de streaming”, avalia Luciano Gomes, diretor de Qualidade da Russell Bedford.
Desde a aprovação da Lei complementar 157 em 2016, que ampliou a cobrança do Imposto Sobre Serviços (ISS) aos setores que ainda não eram tributados passando a afetar empresas como Netflix, Spotify e outras. De acordo com Gomes, tendo esse tipo de serviço de streaming, a empresa estará sujeita a tributação do ISS. Aprovado em 2017 em São Paulo, pela Câmara Municipal a tributação de 2,9% de imposto sobre serviços de aplicativos streaming, por exemplo.
Para entendermos melhor a tributação do ISS e não do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), no contexto dos serviços de streaming, o diretor de Qualidade explica: Conceitualmente os produtos são tangíveis, podem ser tocados, enquanto serviços são intangíveis, não podem ser tocados. No caso o ICMS, a responsabilidade é estadual pela regulamentação, em síntese a sua incidência pode ocorrer em três hipóteses: a) circulação de mercadorias; b) prestação de serviço de transporte interestadual e intermunicipal; e c) prestação de serviço de comunicação, porém é necessário analisar a natureza do serviço prestado, casa haja emissão ou recepção de mensagens, haverá incidência do ICMS, caso contrário os Tribunais Superiores já pacificaram que não haverá cobrança do ICMS. Nesse contexto, os serviços de streaming, que disponibilizam conteúdo acessível a qualquer tempo e em qualquer lugar, de forma onerosa, encontram a regulamentação do ISS, cuja responsabilidade é municipal.
Todas as empresas do segmento que fornecem conteúdo on demand ou sob demanda e cobram por isso se enquadram em serviços, e estão sujeitas a tributação segundo a regulamentação dos municípios pelo ISS. Por exemplo, em Porto Alegre a alíquota é de 2%, em São Paulo 2,9%, no Rio de Janeiro 2% e em Fortaleza 5%, dessa forma, pode ocorrer uma disputa entre os municípios pela arrecadação. “Outras empresas como, por exemplo, Facebook e Youtube, que fornecem conteúdos de streaming, mas não são serviços pagos, não há a incidência do tributo sobre algo que é gratuito. As receitas de anúncios e publicidades que essas plataformas recebem podem sim ser tributadas pelo ISS”, explica Gomes.
Outra questão que deve ser revisitada é a atuação das empresas de OTT (Over The Top) fazendo concorrência com a TV paga com menor carga tributária. Isso acontece, por exemplo, com o Netflix, que paga imposto, mas não o ICMS e sim o ISS. São alíquotas completamente diferentes. Para o diretor da Russell Bedford, são tributos com alíquotas e bases de incidência diferentes, inclusive durante o Brasil Streaming 2019, realizado em 22 de abril de 2019 por TELETIME e TELE VIVA, ficou destacada a indefinição regulatória e, sobretudo, tributária, as discussões sobre o modelo a ser adotado na regulação e na tributação já duram cinco anos e, não há uma previsão de quando os problemas estarão resolvidos. “Adicionalmente ao já comentado sobre ICMS e ISS, o ICMS depende do seu código NCM (Nomenclatura Comum do Mercosul) para saber se terá ICMS ST, Pis e Cofins. Quanto ao ISS, depende exclusivamente do município onde está sendo prestado o serviço para saber a alíquota que será aplicada sobre o serviço”, observa.
Gomes acredita que o mercado está cada vez mais dinâmico, consumidores mais exigentes, novas necessidades, mercados, tecnologias, e oportunidades, com isso, o Estado precisa evoluir, rever a sua forma de tributação, a quantidade de tributos e o peso para os consumidores que é absurda. Em março de 2019, a Agência Brasil (EBC) noticiou que a tributação sobre o PIB que era 32,62% em 2017 foi para 33,58% em 2018, segundo o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, que apresentou a estimativa “Os dados mostram que a arrecadação está se recuperando e que o problema fiscal do Brasil está claramente ligado à despesa”, declarou. Segundo pesquisa CNI de setembro de 2018 (Mapa Estratégico da Indústria 2018-2022), o Brasil é o 15º colocado entre 18 no fator peso dos tributos.
“Onde queremos chegar? Queremos tornar o Estado mais leve e dinâmico, incentivando a abertura de novos negócios, novos mercados e novas tecnologias, reduzindo a quantidade e complexidade da tributação. Os mercados estão evoluindo e com essa nova tendência de produzir e compartilhar conteúdo midiático pode redefinir a forma como consumimos o audiovisual. O amplo leque de opções disponíveis, a reinvenção de nossa relação com as plataformas móveis, o próprio desdobramento desses novos hábitos na indústria da telefonia móvel são algumas das frentes por onde se pode explorar a continuidade desse fenômeno tecnológico da transmissão via streaming e a nossa interação com essa nova possiblidade”, salienta o diretor de Qualidade.
Ele ainda chama atenção para o futuro: “podemos observar as variações no que tange a incidência dos impostos nesse tipo de serviço de streaming. Acreditando na Reforma Tributária, que existe um efeito multiplicador significativo na economia, tanto pode repercutir na redução da estrutura de fiscalização e regulamentação mais enxuta, quanto na geração e formalização de novos negócios e mercados”.
Emissora de TV busca conteúdo digital
A necessidade de repensar as regras tributárias existentes decorre, sobretudo, da mudança da economia tradicional: do mercado de propriedade (market for ownership) para o mercado de acesso temporário (access-based consumption). Muitas empresas têm investido em estratégias para atender essa nova crescente de modelos de negócios. “Para concorrer com empresas como Netflix, que tem um conteúdo diferente e online, Henrique Kirilauskas, diretor comercial Digital da Band, diz que a empresa busca a instantaneidade.
“O ao vivo e a transmissão esportiva já são conhecidos como os diferenciais do VOD. Tem um outro fator que é a construção de conteúdo para o público brasileiro, ao longo dos anos a TV aberta entendeu o comportamento dessa massa e os programas continuam com grande audiência, é claro que o conteúdo exclusivamente digital cresceu, mas nos últimos cinco anos a audiência da TV aberta também cresceu e hoje alcança 97% dos lares brasileiros, nenhuma outra mídia tem esse alcance no país”, analisa.
O mercado será para quem gerar integração da aberta para o digital, vislumbra Kirilauskas que complementa: o conteúdo quando relevante terá uma audiência que não quer apenas “assistir” no momento que exibiu, mas quer compartilhar, comentar, ter mais acessos a conteúdos que não foram ao ar, enfim, se aprofundar sobre aquele conteúdo. “É nisso que eu acredito. Hoje, o Masterchef tem em audiência no youtube em usuários únicos numa semana/episódio o equivalente a quase dois pontos no ibope nacional, isso é sensacional”, pondera.
A Band atualmente desenvolve uma grande entrega também nas plataformas digitais, dando continuidade do conteúdo para o telespectador. “Esse é um processo contínuo e a equipe técnica/engenharia tem essa missão, mas no quesito conteúdo, uma outra vertente importante dessa integração, a Band atua bem com as redes sociais e não é o acaso que temos um grande case no digital que é o Masterchef”, finaliza.